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Vol. 36. Núm. 12.
Páginas 893-894 (dezembro 2017)
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Resposta à terapêutica de ressincronização cardíaca: uma variável dicotómica ou contínua?
Response to cardiac resynchronization therapy: Dichotomous or continuous variable?
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Diogo Magalhães Cavaco
Serviço de Cardiologia, Hospital de Santa Cruz, CHLO, Carnaxide, Portugal
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Rev Port Cardiol. 2017;36:885-9210.1016/j.repc.2017.02.017
Pedro Rio, Mário Martins Oliveira, Pedro Silva Cunha, Manuel Nogueira da Silva, Luísa Moura Branco, Ana Galrinho, Rui Soares, Joana Feliciano, Ricardo Pimenta, Rui Cruz Ferreira
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A ressincronização cardíaca, associada ou não à capacidade de desfibrilhação, veio revolucionar a terapêutica da insuficiência cardíaca, com demonstração clara de remodelagem reversa (o principal fator prognóstico) e com consequente melhoria na qualidade de vida, na classe funcional, no número de internamentos por insuficiência cardíaca e na mortalidade1. No entanto, a taxa de doentes que não responde à terapêutica continua elevada e sem grande modificação desde o seu início – 30 a 40% segundo as séries.

A dificuldade de avaliação dos não respondedores deve‐se a vários aspetos. Os mais importantes relacionam‐se com a identificação do motivo para não haver resposta à terapêutica2. A não resposta à terapêutica de ressincronização é multifactorial e diferente entre doentes. É sabido que doentes com cardiopatia isquémica têm menores taxas de resposta, assim como doentes com fibrilhação auricular, com padrões ECG de «não bloqueio de ramo esquerdo», com hipertensão pulmonar, disfunção biventricular ou outras comorbilidades associadas (insuficiência respiratória, insuficiência renal). Por outro lado, existem fatores relacionados com o procedimento: pacing biventricular ineficaz por má posição do elétrodo (localização em veia anterior do seio coronário, localização muito apical), ou independentemente da localização doentes em que o QRS não encurta pós‐implantação e fatores pós‐procedimento – sobretudo baixa taxa de pacing biventricular (por exemplo, em doentes com fibrilhação auricular persistente, pelo que se recomenda a ablação do nódulo AV), em doentes com muita extrassistolia ventricular (pode ser necessária ablação) e ainda outros fatores, como outras comorbilidades, insuficiência mitral significativa pós‐procedimento ou até terapêutica médica insuficiente3.

O trabalho de Pedro Rio et al. publicado neste número da Revista Portuguesa de Cardiologia4 tenta avaliar o prognóstico de doentes que não respondem (por critérios ecocardiográficos) à terapêutica de ressincronização cardíaca. O tempo de seguimento usado para definição de resposta ecocardiográfica não é muito longo. Em não respondedores iniciais, pode haver uma resposta ecocardiográfica tardia (o que é aliás reconhecido pelos autores nas limitações do estudo). Não há referência a repetição de ecocardiograma no restante tempo do estudo, mas é especulável que alguns dos doentes considerados não respondedores possam ter tido uma resposta mais tardia, o que pode obviamente interferir com os resultados.

A série de doentes é razoável – 178 – e, do ponto de vista de seleção, é a típica de um grupo de doentes fora do contexto de ensaio clínico: todos com QRS alargado (definido como>120 mseg), a maioria com bloqueio completo de ramo esquerdo. Do total da população, 35% tinham cardiopatia isquémica. O facto de se tratar de um registo retrospetivo acarreta algumas limitações: em primeiro lugar, apenas estão representados os doentes em que houve sucesso na implantação. É referido também que o elétrodo se encontrava sempre em posição lateral ou posterolateral. É sabido que essa é a posição ótima de localização do elétrodo esquerdo, mas não é claro se foram excluídos doentes com posições menos boas (que existem sempre em todos os grupos de doentes com esses dispositivos).

A metodologia encontra‐se pouco explícita nalguns pontos: por exemplo, é referido que os aparelhos eram programados em DDD. No entanto, 40% dos doentes da população inicial estão descritos como tendo fibrilhação auricular. Não é claro também quantos desses tinham episódios de fibrilhação e quantos tinham fibrilhação auricular persistente/permanente. Não está também descrito como foi assegurada a elevada percentagem de pacing biventricular nos doentes em fibrilhação auricular (ablação do nódulo AV? fármacos?).

Durante os oito anos de inclusão no registo houve grandes evoluções nos sistemas de ressincronização, o que pode de alguma forma interferir com os resultados (por exemplo, desde 2012 que existem elétrodos quadripolares esquerdos – a norma atual).

As séries do mundo real têm, por outro lado, a vantagem de refletir a população seguida na prática clínica, ao contrário da população dos ensaios clínicos.

Os resultados do presente estudo demonstram uma elevada taxa de resposta ecocardiográfica (61%) e ainda maior taxa de resposta clínica. A mortalidade, assim como o número de hospitalizações, foi superior nos doentes sem resposta ecocardiográfica. Por outro lado, a resposta clínica também foi superior nos doentes com boa resposta ecocardiográfica. Segundo os dados apresentados, nessa população os doentes com resposta clínica e sem resposta ecocardiográfica parecem ter melhor prognóstico do que os não respondedores ecocardiográficos que não melhoram clinicamente. Esse dado, que não é completamente novo, está já publicado noutras séries5, relembra‐nos que a resposta à terapêutica de ressincronização, além de multifatorial (como já referido), não é um fenómeno dicotómico, mas representa, sim, um espectro de possibilidades com doentes a responder mais ou menos à terapêutica de ressincronização – num dos extremos do espectro teremos os doentes que normalizam a fração de ejeção e no outro extremo teremos doentes que, embora não se demonstre melhoria nos parâmetros ecocardiográficos, apresentam melhoria da classe funcional e de outros parâmetros relacionados com a insuficiência cardíaca.

Conflitos de interesse

O autor declara não haver conflitos de interesses.

Referências
[1]
J.G. Cleland, J.C. Daubert, E. Erdmann, et al.
The effect of cardiac resynchronization on morbidity and mortality in heart failure.
N Engl J Med, 352 (2005), pp. 1539-1549
[2]
C. Daubert, N. Behar, R. Martins, et al.
Avoiding non‐responders to cardiac resynchronization therapy: A practical guide.
Eur Heart J, 38 (2017), pp. 1463-1472
[3]
P. Carita, E. Corrado, G. Pontone, et al.
Non‐responders to cardiac resynchronization therapy: insights from multimodality imaging and electrocardiography. A brief review.
Int J Cardiol, 225 (2016 Dec 15), pp. 402-407
[4]
P. Rio, M. Oliveira, P. Cunha, et al.
O que acontece aos não respondedores na terapia de ressincronização cardíaca.
Rev Port Cardiol., 36 (2017), pp. 885-892
[5]
M. Bertini, U. Höke, R. van Bommel, et al.
Impact of clinical and echocardiographic response to cardiac resynchronization therapy on long‐term survival.
Eur Heart J Cardiovasc Imaging, 14 (2013 Aug), pp. 774-781
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