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Vol. 32. Núm. 6.
Páginas 477-482 (Junho 2013)
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Páginas 477-482 (Junho 2013)
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Avaliação ecocardiográfica da dilatação da raiz da aorta em doentes adultos operados a tetralogia de Fallot
Echocardiographic assessment of the aortic root dilatation in adult patients after tetralogy of Fallot repair
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Cristina Cruza,b,
Autor para correspondência
mcristina.cruz@hsjoao.min-saude.pt

Autor para correspondência.
, Teresa Pinhoa,b, Ana Lebreiroa,b, José Silva Cardosoa,b, Maria Júlia Maciela,b
a Serviço de Cardiologia, Centro Hospitalar São João, Porto, Portugal
b Departamento de Medicina, Faculdade de Medicina do Porto, Porto, Portugal
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Figuras (2)
Tabelas (2)
Tabela 1. Dados ecocardiográficos: comparação dos grupos 1 e 2
Tabela 2. Preditores de dilatação da raiz da aorta ao nível dos seios de Valsalva
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Resumo
Introdução

O ecocardiograma transtorácico é fundamental na avaliação de doentes operados a tetralogia de Fallot. A dilatação da raiz da aorta é uma complicação descrita. Neste estudo, avaliámos a sua prevalência e potenciais preditores.

População e métodos

Estudo consecutivo de adultos operados a tetralogia de Fallot. O diâmetro interno máximo da aorta ao nível dos seios de Valsalva (DAo) foi avaliado por ecocardiograma transtorácico, em paraesternal eixo longo. Definimos dois grupos: grupo 1 com dilatação da raiz da aorta (DAo ≥ 38mm) e grupo 2 sem dilatação (DAo < 38mm).

Resultados

Incluímos 53 doentes (idade média 32±10 anos); intervalo médio desde a cirurgia 23±7 anos. Vinte e cinco doentes tinham um shunt sistémico pulmonar prévio e 19 tinham patch transanular. Foi possível medir a raiz da aorta em todos os doentes. Em 8 (15%) doentes, todos homens, foi identificada dilatação da raiz da aorta, sendo seus preditores o sexo masculino (p = 0,001), a superfície corporal (1,93±0,10 versus 1,70±0,20 m2, p = 0,003) e um maior diâmetro telediastólico ventricular esquerdo (p = 0,005). Nenhuma das variáveis cirúrgicas estudadas influenciou a dilatação da raiz da aorta.

Conclusões

A prevalência de dilatação da raiz da aorta foi baixa, sendo o sexo masculino um preditor da sua ocorrência. O tipo de cirurgia ou o tempo até à cirurgia não influenciaram o seu aparecimento.

A quantificação do diâmetro da raiz da aorta é possível por ecocardiograma transtorácico, sugerindo-se a indexação à superfície corporal na prática clínica.

Palavras-chave:
Dilatação da aorta
Ecocardiograma transtorácico
Tetralogia de Fallot
Abstract
Introduction

Transthoracic echocardiography is an important tool after tetralogy of Fallot repair, of which aortic root dilatation is a recognized complication. In this study we aimed to assess its prevalence and potential predictors.

Methods

We consecutively assessed adult patients by transthoracic echocardiography after tetralogy of Fallot repair, and divided them into two groups based on the maximum internal aortic diameter at the sinuses of Valsalva in parasternal long-axis view: group 1 with aortic root dilatation (≥38 mm) and group 2 without dilatation (<38 mm).

Results

A total of 53 patients were included, mean age 32±10 years, with a mean time since surgery of 23±7 years. An aortopulmonary shunt had been performed prior to complete repair in 25 patients, and a transannular patch was used in 19 patients. Aortic root measurement was possible in all patients. Aortic root dilatation was identified in eight patients (15%), all male. Male gender (p=0.001), body surface area (1.93±0.10 vs. 1.70±0.20 m2, p=0.03) and increased left ventricular end-diastolic diameter (p=0.005) were predictors of aortic root dilatation. None of the surgical variables studied were predictors of aortic root dilatation.

Conclusions

The prevalence of aortic root dilatation in this cohort was low and male gender was a predictor of its occurrence. The type of repair and time to surgery did not influence its occurrence.

Quantification of aortic root diameter is possible by transthoracic echocardiography; we suggest indexing it to body surface area in clinical practice.

Keywords:
Aortic dilatation
Transthoracic echocardiography
Tetralogy of Fallot
Texto Completo
Introdução

A tetralogia de Fallot (TF) é a cardiopatia congénita cianótica mais frequente com sobrevivência até à idade adulta, implicando, de acordo com recomendações internacionais, um seguimento regular e longo em centros especializados em cardiopatias congénitas do adulto1.

Mesmo após uma correção cirúrgica completa, estes doentes apresentam lesões residuais importantes, bem como a possibilidade de desenvolver alterações com significado hemodinâmico, como sejam a dilatação do ventrículo direito (VD) e do tronco pulmonar, insuficiência pulmonar e/ou tricúspide, disfunção ventricular e disrritmias potencialmente fatais2. Apesar de menos frequente, pode ainda ser detetada uma dilatação progressiva da raiz da aorta (Ao)3,4 com consequente insuficiência aórtica e risco de dilatação aneurismática e dissecção da Ao torácica potencialmente fatal5,6, com necessidade de intervenção cirúrgica7. Esta dilatação da aorta parece estar na dependência de alterações histológicas intrínsecas8–11, com consequentes alterações elásticas e hemodinâmicas da Ao, assim como da sobrecarga de volume aórtico prévio12–14.

O ecocardiograma transtorácico (ETT) tem um papel fundamental na avaliação imagiológica da Ao em doentes operados a TF, sendo crescente o contributo das novas técnicas de imagem, nomeadamente da tomografia axial computorizada e da ressonância magnética cardiovascular15,16,mas as implicações em termos da relação custo/benefício justificam o seu uso judicioso.

Neste estudo, pretendemos avaliar por ETT a prevalência de dilatação da raiz da Ao em doentes adultos operados a TF e determinar parâmetros demográficos, clínicos, cirúrgicos e imagiológicos que possam ser potenciais preditores.

População e métodos

Este estudo avaliou uma amostra de 53 de um total de 71 doentes consecutivos, com idade igual ou superior a 18 anos, seguidos na Consulta de Cardiopatias Congénitas do Adulto do Centro Hospitalar São João, de março a dezembro de 2011, após a obtenção prévia e livre do consentimento informado escrito, de acordo com as normas previstas na Declaração de Helsínquia e com a Comissão de Ética do Centro Hospitalar São João.

Foram excluídos doentes não operados por razões anatómicas ou por recusa do doente, coexistência de estenose e/ou insuficiência valvular aórtica moderada a grave (um doente com estenose valvular aórtica moderada; dois doentes com prótese mecânica aórtica), doentes portadores de síndromas genéticas (10 portadores de síndroma Down e um de síndroma DiGeorge) e gravidez (quatro grávidas).

A avaliação imagiológica consecutiva dos 53 doentes foi realizada por ETT, sendo a aquisição realizada por um único operador com treino específico em cardiopatias congénitas, com recurso ao ecocardiógrafo Vivid 7 (GE Healthcare, Milwaukee, Wisconsin, Estados Unidos), com pós-processamento no sistema EchoPac. Foi usado o ecocardiograma bidimensional, em paraesternal eixo longo, para a medição dos diâmetros internos máximos da Ao torácica ao nível dos seios de Valsalva (DAo), junção sinotubular e Ao ascendente (1-2cm acima do plano da junção sinotubular). O grau de insuficiência aórtica, pulmonar e tricúspide foi avaliada por Doppler contínuo e Doppler cor, sendo classificada como ausente, menor que moderada e moderada a grave. Os gradientes máximos entre o VD e a artéria pulmonar, bem como entre o VD e a aurícula direita, foram estimados através da velocidade máxima obtida por Doppler contínuo, segundo a equação de Bernoulli modificada. Os diâmetros telediastólico e telessistólico do ventrículo esquerdo (VE) e a fração de ejeção ventricular esquerda foram avaliados segundo técnicas validadas em modo M e bidimensional. A função sistólica do VE foi considerada comprometida se a fração de ejeção fosse < 55%. O VD foi avaliado via apical 4 câmaras, em telediástole, e considerado dilatado para um diâmetro basal > 40mm, sendo classificado da seguinte forma: de diâmetro normal, dilatação menor que moderada (< 50mm) e dilatação moderada a grave (≥ 50mm). A função sistólica do VD foi considerada comprometida se a excursão sistólica do anel tricúspide estimada por modo M fosse < 16mm ou S’ estimado por Doppler tecidular ao nível do anel tricúspide lateral < 10cm/s. A variabilidade intraobservador foi determinada pela repetição da medição dos DAo torácica em 10 casos aleatórios.

Analisámos os dados demográficos, os registos clínicos e cirúrgicos dos doentes para estabelecer variáveis potencialmente preditoras de dilatação da raiz da Ao.

Definimos dois grupos com base no valor absoluto máximo do DAo ao nível dos seios de Valsalva em paraesternal eixo longo: um grupo 1 com dilatação da raiz da Ao (DAo ≥ 38mm) e um grupo 2 sem dilatação (DAo < 38mm). Estimámos a média e o desvio padrão do DAo, expresso em z-score, definido pela fórmula do Boston Children's Hospital17, indexada à superfície corporal pela fórmula de Haycock18 (Tabela 1).

Tabela 1.

Dados ecocardiográficos: comparação dos grupos 1 e 2

  Grupo 1 (n=8)  Grupo 2 (n=45)  Valor de p 
Seios de Valsalva (mm)  42±32±< 0,0001 
Índex seios de Valsalva (mm/m222±19±0,002 
Z-score dos seios de Valsalva  3,90±0,62  2,02±0,93  < 0,0001 
Junção sinotubulara (mm)  34±31±0,35 
Aorta ascendenteb (mm)  39±32±0,04 
Diâmetro telediastólico VE (mm)  52±46±0,005 
Fração de ejeção do VE (%)  61±65±0,51 
Dilatação do VD moderada a grave  4 (50)  27 (60)  0,70 
Função sistólica do VD comprometida  2 (25)  6 (13)  0,59 
Insuf. pulmonar moderada a grave  3 (37)  24 (53)  0,47 
Insuf. tricúspide moderada a grave  1 (12)  3 (7)  0,49 
Gradiente máximo VD/AP  25±12  22±11  0,46 
Gradiente máximo VD/AD  36±17  32±0,55 

AD: aurícula direita; AP: artéria pulmonar; Insuf.: insuficiência; VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo.

Valores em média±DP ou n (%).

a

Análise possível apenas em 33 doentes, sem apagamento da junção sinotubular.

b

Análise realizada em 50 doentes.

A análise estatística dos dados foi efetuada com base no programa estatístico SPSS 19.0 (Chicago, Illinois, Estados Unidos). As variáveis categóricas estudadas são apresentadas em frequência absoluta e em percentagem e comparadas com o teste do χ2 ou teste exato de Fisher, quando apropriado. As variáveis contínuas são apresentadas como média ± desvio padrão e comparadas com o teste «t» de Student. Um valor p < 0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

Incluímos 53 doentes, com idade média de 32±10 anos, 30 dos quais mulheres (57%). A maioria dos doentes (83%) estava na classe funcional i da NYHA, 8 (15%) na classe ii e apenas um doente na classe iii. O intervalo médio desde a cirurgia foi de 23±7 anos. Em 25 (47%) dos doentes foi realizado um shunt sistémico pulmonar (SP) prévio à correção cirúrgica da TF, com um intervalo de tempo mediano de 4 anos (entre um e 22 anos) entre o shunt e a cirurgia reparadora. Em 19 (53%) dos doentes a correção cirúrgica fez uso de um patch transanular. Nenhum doente revelou a presença de shunt intracardíaco ou estenose pulmonar residuais com significado hemodinâmico na avaliação ecocardiográfica realizada. Trinta e um doentes apresentaram dilatação do VD moderada a grave (diâmetro telediastólico do VD ≥ 50mm), 8 (15%) apresentaram disfunção sistólica ventricular direita e três (6%) disfunção sistólica ventricular esquerda. Em 27 doentes (51%) a insuficiência pulmonar foi considerada moderada a grave, mas a insuficiência tricúspide moderada a grave foi encontrada em apenas quatro doentes. A quantificação do DAo foi possível em todos os casos (Tabela 1), havendo uma correlação excelente (p<0,0001) entre o seu valor absoluto, o indexado à superfície corporal e o z-score estimado pela fórmula do Boston Children's Hospital (Figuras 1 e 2).

Figura 1.

Gráfico demonstrando a excelente correlação (r2=0,76) entre o valor absoluto do diâmetro interno da raiz da aorta ao nível dos seios de Valsalva e o z-score estimado pela fórmula do Boston Children's Hospital (p<0,0001).

(0,09MB).
Figura 2.

Gráfico demonstrando a correlação (r2=0,29) entre o valor absoluto do diâmetro interno da raiz da aorta ao nível dos seios de Valsalva e a sua indexação à superfície corporal (mm/m2).

(0,1MB).

Oito (15%) doentes, todos do sexo masculino, apresentaram dilatação da raiz da Ao (grupo 1). Seis estavam assintomáticos, um doente na classe ii e um na classe iii da NYHA. Apenas um dos 10 doentes com arco aórtico direito apresentava dilatação da raiz da Ao.

Das variáveis analisadas (Tabela 2), apenas os fatores sexo masculino (p = 0,001), a superfície corporal (1,93±0,10 versus 1,70±0,20 m2, p = 0,003) e o diâmetro telediastólico do VE (52±3 versus 46±5mm, p = 0,005) foram preditores de dilatação da raiz da Ao. Nenhuma das variáveis cirúrgicas avaliadas (shunt SP prévio, patch transanular, tempo entre shunt SP e a correção cirúrgica, tempo até à correção cirúrgica) foi preditora de dilatação da raiz da Ao.

Tabela 2.

Preditores de dilatação da raiz da aorta ao nível dos seios de Valsalva

  Grupo 1 (n=8)  Grupo 2 (n=45)  Valor de p 
Sexo M:F  8:0  15:30  0,001 
Idade (anos)  34±12  32±0,45 
Shunt SP (%)  2 (25)  23(51)  0,26 
Patch transanulara (%)  1 (12)  18(51)  0,08 
Arco aórtico direito  1 (12)  9 (20)  1,0 
Diâmetro telediastólico do VE (mm)  52±46±0,005 
Tempo shunt-cirurgiab (anos)  7 (4-11)  3 (1-22)  0,29 
Tempo até cirurgia (anos)  8 (3-49)  5 (2-39)  0,10 
Superfície corporal (m21,93±0,10  1,70±0,20  0,003 
Tempo desde a cirurgia (anos)  20±10  23±0,25 

Cirurgia: cirurgia de correção da TF; F: feminino; M: masculino; SP: sistémico pulmonar; VE: ventrículo esquerdo.

Grupo 1: DAo ≥ 38mm; Grupo 2: DAo < 38mm.

Valores em média±DP ou n (%); mediana (valor mínimo-máximo).

a

Análise em 36 doentes com nota operatória detalhada da cirurgia de correção da TF.

b

Análise em 25 doentes com shunt prévio à cirurgia de correção da TF.

Discussão

Neste estudo, foi possível avaliar a raiz da Ao por ETT, com medição do diâmetro interno dos seios de Valsalva em paraesternal eixo longo em todos os doentes, reforçando o papel do ETT como uma ferramenta fundamental na avaliação imagiológica de doentes operados a TF.

A dilatação da Ao em doentes operados a TF foi inicialmente descrita por Capelli et al. em 1982, em doentes previamente operados a TF19. Um possível mecanismo fisiopatológico para o desenvolvimento de dilatação da A seria a sobrecarga de volume do VE e da Ao, ao longo dos anos, secundária ao shunt direito-esquerdo, resultante da associação da comunicação interventricular com a obstrução da câmara de saída do VD e/ou estenose pulmonar.

O tipo de cirurgia, incluindo a necessidade de cirurgia paliativa (anastomose SP) prévia à cirurgia reparadora, ou o tempo que mediou desde a cirurgia não influenciaram, nesta amostra, a ocorrência de dilatação da raiz da Ao, sugerindo que o desenvolvimento desta complicação estará dependente de fatores prévios à cirurgia, como sejam o grau de estenose pulmonar, a magnitude do shunt direito-esquerdo, ou fatores relacionados com o doente ou de natureza genética. Todos os doentes do grupo 1 eram do sexo masculino, reforçando a relação do sexo masculino com a dilatação da Ao, como já anteriormente descrito3. Por outro lado, não havendo predominância de sexo na TF, este achado é pertinente. Neste estudo, o sexo masculino manteve significado estatístico mesmo após a indexação do DAo à superfície corporal (p = 0,002). A maior superfície corporal associou-se a um maior DAo, sendo importante a sua indexação na avaliação da dimensão da Ao, com implicações no seguimento seriado a longo prazo.

O z-score dos seios de Valsalva, sendo uma ferramenta de estandardização dos DAo numa população, permitiu distinguir os grupos 1 e 2 (3,90±0,62 versus 2,02±0,93, p<0,0001), mas a fórmula do Boston Children's Hospital17 pode introduzir um erro na interpretação dos dados obtidos através deste cálculo, já que implica a extrapolação da avaliação dos DAo numa população pediátrica para uma população adulta.

No estudo de Niwa et al. que incluiu doentes adultos com TF e doentes com atrésia pulmonar após correção cirúrgica, a dilatação da raiz da Ao apresentou uma prevalência de 15%, sendo os fatores como o sexo masculino, a atrésia pulmonar, o arco aórtico direito, o maior intervalo de tempo entre o shunt paliativo SP e a cirurgia corretiva, possíveis preditores de dilatação da raiz da Ao3. No entanto, o arco aórtico direito é mais prevalente na atrésia pulmonar, sendo expectável a dilatação da Ao nestes doentes. Comparativamente com o estudo de Niwa et al., também o sexo masculino teve uma maior prevalência de dilatação da raiz da Ao, mas, por oposição, o nosso estudo não revelou uma associação com significado estatístico entre um maior tempo entre o shunt SP e a cirurgia corretiva da TF e a dilatação da raiz da Ao. De salientar que, nesta amostra, apenas 25 (47%) dos doentes avaliados tinham realizado um shunt paliativo prévio, enquanto, no estudo em causa, essa percentagem foi de 56%.

Além da contribuição das possíveis alterações histológicas da parede da Ao, presentes desde a infância em doentes com TF9, a sobrecarga de volume sistémica crónica postulada como um mecanismo fisiopatológico para o desenvolvimento da dilatação da Ao neste contexto, faria prever que um maior tempo até à cirurgia de correção da TF, com ou sem shunt paliativo prévio, poderia ser um fator predisponente para o seu desenvolvimento. No entanto, no nosso estudo isso não se verificou. Também o recurso ao patch transanular na correção intracardíaca da TF poderia indiciar um maior grau de obstrução a nível pulmonar, com consequente maior shunt sistémico através da comunicação interventricular, predispondo ao desenvolvimento de dilatação da Ao a longo prazo. Neste estudo, o patch transanular não atingiu significado estatístico como fator de risco para a ocorrência de dilatação da raiz da Ao na idade adulta mas apenas 36 doentes tinham informação detalhada do tipo de cirurgia realizada aquando da correção intracardíaca da TF.

Limitações do estudo

Este estudo analisa os dados de doentes seguidos numa consulta especializada, num hospital terciário de referenciação da região norte do país na área das cardiopatias congénitas, podendo assim refletir casos mais complexos.

O limiar do DAo < 38mm utilizado neste estudo para definir o grupo sem dilatação da raiz da Ao pode ser considerado arbitrário.

Finalmente, a dimensão limitada da amostra, bem como a impossibilidade de obter uma informação descritiva da cirurgia de correção da TF em todos os doentes, pode condicionar as conclusões.

Apesar das limitações descritas pensamos que o estudo constitui um contributo válido para uma melhor caracterização da dilatação da Ao em doentes operados a TF, visto serem escassos os estudos publicados.

Conclusões

A prevalência de dilatação da raiz da Ao foi baixa neste grupo de doentes operados a TF, sendo o sexo masculino um fator preditor da sua ocorrência. O risco do desenvolvimento de aneurisma e dissecção da Ao, anos após a cirurgia de correção da TF, reforça a importância do rastreio regular das dimensões da raiz da Ao nestes doentes.

A quantificação do DAo é possível por ETT, sugerindo-se a sua indexação à superfície corporal na prática clínica, permitindo assim diagnosticar atempadamente esta complicação e prevenir uma potencial causa de morte nestes doentes.

Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animais

Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram ter seguido os protocolos de seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes e que todos os pacientes incluídos no estudo receberam informações suficientes e deram o seu consentimento informado por escrito para participar nesse estudo.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência deve estar na posse deste documento.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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