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Vol. 33. Núm. 12.
Páginas 781-788 (dezembro 2014)
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Vol. 33. Núm. 12.
Páginas 781-788 (dezembro 2014)
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Eficácia das terapias de pacing auricular antitaquicardia no tratamento da fibrilhação auricular paroxística em doentes portadores de pacemaker
Effectiveness of atrial antitachycardia pacing in the treatment of paroxysmal atrial fibrillation in patients with pacemakers
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Rui Silvaa,
Autor para correspondência
ramsilv@gmail.com

Autor para correspondência.
, Telmo Pereirab,c, Vitor Martinsa
a Laboratório de Pacing, Serviço de Cardiologia, Hospital de Santarém, EPE, Santarém, Portugal
b Departamento de Cardiopneumologia, Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Coimbra, Portugal
c Departamento de Cardiopneumologia, Universidade Metodista de Angola, Luanda, Angola
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Tabela 1. Características clínicas basais da coorte
Resumo
Introdução

O objetivo do estudo foi avaliar a eficácia do pacing auricular antitaquicardia (ATP) na conversão de episódios de taquiarritmia auricular e seu impacto na redução da carga arrítmica.

Métodos

Estudo retrospetivo que decorreu no laboratório de pacing num hospital distrital, incluindo consecutivamente 57 doentes que implantaram pacemaker dupla câmara, com capacidade de realizar pacing auricular antitaquicardia, entre 2005‐2010. Formaram‐se dois grupos, grupo ATP_ON constituído por 24 doentes e grupo ATP_OFF constituído por 33 doentes. O período de seguimento foi de 15 meses, tendo‐se recolhido os dados das consultas de seguimento de pacing realizadas em três momentos distintos, o primeiro ao 3.° mês após o implante (M1), o segundo ao 9.° mês (M2) e o último ao 15.° mês (M3), incluindo este período, tentativa de tratamento por ATP de 12 428 episódios de taquiarritmias auriculares.

Resultados

Apesar de não ocorrerem diferenças estatisticamente significativas, verificou‐se uma tendência favorável ao grupo ATP_ON, visto que, o aumento de carga arrítmica foi menos acentuado neste grupo. Também neste grupo se verificou percentagem média de pacing ventricular apical significativamente inferior, associando‐se este parâmetro a redução marginalmente significativa da carga arrítmica (p=0,06). Verificou‐se uma relação significativamente positiva entre a evolução da percentagem de pacing ventricular e a evolução da carga arrítmica (R=0,417, p=0,02).

Conclusões

O pacing auricular antitaquicardia converteu 59,7% dos episódios de arritmia auricular, mas não reduziu significativamente a carga arrítmica. Verificou‐se correlação significativamente positiva entre a evolução da percentagem de pacing ventricular e a evolução da carga arrítmica.

Palavras‐chave:
Fibrilhação auricular
Pacing auricular antitaquicardia
Pacing ventricular
Carga arrítmica
Abstract
Introduction

The aim of this study was to assess the effectiveness of atrial antitachycardia pacing (ATP) in the conversion of atrial tachyarrhythmia episodes, and its impact in reducing arrhythmic burden.

Methods

We performed a retrospective study in the pacing laboratory of a district hospital of 57 consecutive patients implanted with a dual chamber pacemaker, capable of performing atrial antitachycardia pacing, between 2005 and 2010. The patients were divided into two groups: ATP_ON (n=24) and ATP_OFF (n=33). The follow‐up period was 15 months, with data being collected at three follow‐up consultations: the first at three months after implantation, the second at nine months and the last at 15 months. In this period, there were 12 428 ATP therapies of atrial tachyarrhythmias.

Results

Although there were no statistically significant differences, there was a trend in favor of the ATP_ON group, the increase in arrhythmic burden being less marked in this group. The mean percentage of ventricular apical pacing was also significantly lower in this group, which was associated with a marginally significant reduction in arrhythmic burden (p=0.06). There was a significant positive correlation between changes in the percentage of ventricular pacing and changes in arrhythmic burden (r=0.417, p=0.02).

Conclusions

Atrial antitachycardia pacing converted 59.7% of episodes of atrial arrhythmia, but did not significantly reduce arrhythmic burden. There was a significant positive correlation between changes in the percentage of ventricular pacing and changes in arrhythmic burden.

Keywords:
Atrial fibrillation
Atrial antitachycardia pacing
Ventricular pacing
Arrhythmic burden
Texto Completo
Introdução

A fibrilhação auricular (FA) é uma das doenças cardíacas mais frequentes, afetando cerca de 1% da população geral, estando presente em quase 10% na população com idade superior a 80 anos1,2. A orientação clínica baseia‐se na prevenção do acidente vascular cerebral (AVC), assentando na terapêutica anticoagulante e no controle do ritmo ou da frequência ventricular.

O pacing auricular antitaquicardia (ATP) constitui uma opção terapêutica para controlo do ritmo em doentes portadores de pacemaker definitivo dotados com esta capacidade, consistindo genericamente na administração de um número de impulsos fixo (burst) ou consecutivamente mais rápidos (ramp) do que a frequência auricular, de modo a terminar rapidamente o episódio, conseguindo deste modo abortar precocemente os episódios de FA/flutter auricular. Desta forma, procura‐se limitar o remodeling auricular e o fenómeno de taquicardiomiopatia, bem como reduzir o tempo do episódio e a percentagem de carga arrítmica, sendo esta última um fator predisponente para AVC3–5.

A eficácia do ATP pode depender da frequência e regularidade da arritmia, contudo, alguns ritmos mais rápidos e irregulares podem ser convertidos pelo ATP, visto que alguns episódios de FA podem apresentar regularidade no início sendo vulneráveis ao ATP6. Múltiplas variações tanto na duração do ciclo como na regularidade podem ocorrer durante um longo episódio arrítmico, sendo o algoritmo ATP mais eficaz no tratamento do flutter auricular e taquicardia auricular lenta organizada7,8. O estudo realizado por Gillis et al., que incluiu 71 pacientes num follow‐up de três anos, mostrou que nem o algoritmo ATP isolado nem o ATP em associação com algoritmos de prevenção de FA conseguem reduzir significativamente o tempo em arritmia auricular (AT/AF)9.

O estudo realizado por Vollmann et al., que incluiu 22 pacientes e tentativa de tratamento em 10 026 episódios de arritmia auricular, mostrou que a taxa de sucesso do ATP é superior nos doentes com terapia imediata comparando com terapia atrasada (59±7% versus 22±5%, p <0,01), porém, esta maior eficácia não se traduziu numa redução significativa da carga arrítmica10. No estudo PITAGORA que incluiu 176 pacientes e comparou a eficácia da terapia ramp versus burst+ foi demonstrado que a sequência de ramp provou ser mais eficaz na conversão de episódios de taquicardia auricular (53,1 versus 44,3%, p <0,001) para uma duração de ciclo >240ms, justificando‐se esta vantagem com a teoria da conversão por pacing de taquicardia auricular com presumível mecanismo de reentrada e também devido ao facto da terapia ramp entregar um grande número de impulsos com ciclos diferentes dentro de cada sequência, havendo maior probabilidade de capturar a aurícula11. Ficou ainda demonstrado melhoria da qualidade de vida sobretudo no grupo de pacientes com eficácia de ATP >60%12.

A otimização do ATP auricular pode reduzir a duração dos episódios de taquicardia auricular e também ter alguma importância na prevenção de eventos cardioembólicos sendo, no entanto, necessário manter anticoagulação em doentes com fatores de risco tromboembólico11.

O potencial benefício destes algoritmos, aliado à sua disponibilidade em alguns modelos de pacemakers convencionais, aconselha assim à demonstração desse benefício em doentes em contexto de prática clínica corrente, o que constitui o principal objetivo do presente trabalho. Procuraremos avaliar a eficácia do ATP auricular na redução da carga arrítmica, bem como identificar os fatores preditores do bom desempenho deste algoritmo, contribuindo deste modo para a otimização da sua utilização.

Métodos

Realizou‐se um estudo retrospetivo no laboratório de pacing de um hospital distrital, tendo sido incluídos doentes consecutivos em que foi implantado pacemaker dupla câmara (Enrhythm P1501DR Medtronic Inc., Minneapolis, Minnesota, EUA), no período compreendido entre janeiro de 2005 e dezembro de 2010. A amostra ficou assim constituída por um total de 57 pacientes (28 do sexo masculino e 29 do sexo feminino), com um período de follow‐up médio de 15 meses. Em nove pacientes foi ativado o algoritmo ATP ao 1.° mês de implante e em 15 pacientes o algoritmo foi ativado aos três meses (M1), enquanto os restantes (n=33) se mantiveram com o algoritmo inativo até ao final do follow‐up, formando‐se deste modo dois grupos de pacientes: um com a terapia ATP ativa (ATP_ON) e o outro grupo com o algoritmo desativado (ATP_OFF). A decisão de ativar o algoritmo ATP foi tomada com base na presença de arritmias auriculares durante o follow‐up, em doentes com carga arrítmica superior a 0,1%. No grupo ATP_ON apenas num doente o modo de minimização de pacing ventricular managed ventricular pacing (MVP) se encontrava inativo, enquanto no grupo ATP_OFF este modo encontrava‐se inativo em sete pacientes (p=0,183). Na Tabela 1 sumariam‐se as características clínicas fundamentais da amostra, não se evidenciando diferenças significativas entre os grupos na idade, distribuição por género, fatores de risco cardiovasculares e história de eventos prévios. Não se encontraram também diferenças significativas nas terapias farmacológicas em curso entre os grupos. Do ponto de vista das indicações para a implantação de pacemaker, em 80,7% (n=46) dos casos o motivo foi doença do nódulo sinusal e nos restantes casos bloqueio auriculoventricular (2.° grau: 5,3%, n=3; 3.° grau: 14,0%, n=8). A distribuição das indicações no grupo ATP_OFF e ATP_ON foi semelhante (p=0,29). Cerca de 45 pacientes (78,9%) apresentavam antecedentes de FA/flutter auricular documentados, não havendo diferenças estatisticamente significativas entre os grupos ATP_ON e OFF nesta característica (p=0,97).

Tabela 1.

Características clínicas basais da coorte

  Total  ATP_OFF  ATP_ON 
  (n=57)  (n=33)  (n=24)  (entre grupos) 
Idade, anos (média ± DP)  73,05±9,11  73,61±8,99  72,29±9,44  0,60 
Género
Masculino, % (n)  49,1 (28)  42,4 (14)  58,3 (14)  0,29 
Feminino, % (n)  50,9 (29)  57,6 (19)  41,7 (10)   
Hipertensão arterial
Não, % (n)  10,5 (6)  9,1 (3)  12,5 (3)  0,68 
Sim, % (n)  89,5 (51)  90,9 (30)  87,5 (21)   
Dislipidemia
Não, % (n)  47,4 (27)  51,5 (17)  41,7 (10)  0,59 
Sim, % (n)  52,6 (30)  48,5 (16)  58,3 (14)   
Diabetes mellitus
Não, % (n)  78,9 (45)  81,8 (27)  75,0 (18)  0,74 
Sim, % (n)  21,1 (12)  18,2 (6)  25,0 (6)   
Insuficiência cardíaca congestiva
Não, % (n)  77,2 (44)  72,7 (24)  83,3 (20)  0,52 
Sim, % (n)  13 (22,8)  27,3 (9)  16,7 (4)   
Insuficiência renal crónica
Não, % (n)  86,0 (49)  84,8 (28)  87,5 (21)  0,78 
Sim, % (n)  14,0 (8)  15,2 (5)  12,5 (3)   
Acidente vascular cerebral
Não, % (n)  93,0 (53)  93,9 (31)  91,7 (22)  0,74 
Sim, % (n)  7,0 (4)  6,1 (2)  8,3 (2)   
Fibrilhação/flutter auricular paroxística
Não, % (n)  21,1 (12)  21,2 (7)  20,8 (3)  0,97 
Sim, % (n)  78,9 (45)  78,8 (26)  79,2 (19)   

ATP: pacing antitaquicardia; DP: desvio‐padrão.

Os doentes foram selecionados de acordo com o modelo de pacemaker implantado, recolhendo‐se toda a informação constante do processo individual, bem como dos registos das consultas de follow‐up realizadas no laboratório de pacing. Todos os dados relativos ao funcionamento do pacemaker foram obtidos em cada uma das consultas de pacing, através do programador Medtronic Carelink modelo 2.090, com cabeçote de programação 2067. Recolheu‐se informação quanto à percentagem de sucesso da terapia ATP, percentagem de carga arrítmica, percentagem de pacing auricular e ventricular, número de episódios em que ocorreu tentativa de tratamento e número de episódios tratados com sucesso. A recolha dos dados foi efetuada retrospetivamente e incluiu a consulta realizada ao 3.° mês (M1), ao 9.° mês (M2) e ao 15.° mês (M3).

No início do estudo (M1) efetuavam terapêutica antiarrítmica 29 pacientes (50,9%) evoluindo para 32 (56,1%) no 2.° follow‐up (M2) e 36 (63,2%) no 3.° follow‐up (M3), sem diferenças estatisticamente significativas entre os grupos.

Tratamento estatístico

Os dados relativos aos sujeitos da amostra foram informatizados e tratados com recurso ao programa SPSS para Windows, versão 19,0. A distribuição das variáveis foi testada, quanto à normalidade, pelo teste de Kolmogorov‐Smirnov, e quanto à homogeneidade das variâncias pelo teste de Levene. Recorreu‐se a uma estatística descritiva simples para caracterização geral da amostra e da distribuição das variáveis.

As comparações entre grupos foram realizadas através do teste χ2 para variáveis categóricas, ou do teste t de Student (dois grupos) para variáveis quantitativas. A análise estatística dos dados recorreu também a ANOVA de medidas repetidas efetuadas sobre as várias medidas consideradas nos diversos momentos de avaliação. Nos casos em que se verificou a violação da esfericidade foi adotada a correção de Greenhouse‐Geisser para os graus de liberdade. Todas as comparações múltiplas destinadas a localizar os efeitos significativos de um fator foram realizadas com ajustamento de Bonferroni para os níveis de significância. Realizaram‐se frequentemente análises de regressão linear simples complementadas com análises de regressão linear múltipla. O critério de significância estatística utilizado foi um valor de p ≤0,05 para um intervalo de confiança de 95%.

Resultados

Em todos os doentes incluídos no estudo, o eletrocateter auricular foi posicionado no apêndice auricular direito (AAD) e o ventricular no ápex do ventrículo direito (VD). Durante o estudo verificaram‐se 12 428 tentativas cumulativas de tratamento por ATP de episódios de FA/flutter auricular, com interrupção do episódio arrítmico em 7420 episódios (eficácia estimada a 15 meses de 59,7%). Particularizando por momento de follow‐up, aos três meses de follow‐up (M1), com nove pacientes com algoritmo de tratamento ativo, verificaram‐se 1019 tentativas de ATP auricular, das quais se verificou sucesso terapêutico em 604 episódios (59,3% eficácia de ATP). Aos nove meses de follow‐up (M2), em 5458 episódios contabilizados, foram tratados com sucesso 3019 (55,3% de eficácia de ATP), enquanto aos 15 meses (M3), em 5951 episódios, foram tratados 3797 (63,8% eficácia de ATP). A variação da eficácia do ATP nos três momentos de follow‐up não foi estatisticamente significativa (p=0,638), indicando uma estabilidade longitudinal na eficácia desta terapêutica.

A média de carga arrítmica foi de 6,64% no grupo ATP_OFF e 7,51% no grupo ATP_ON (p=0,845) no momento M1, passando para 6,57% no grupo ATP_OFF e 7,39% no grupo ATP_ON no momento M2 (p=0,867). No momento M3 esta foi de 12,68% no grupo ATP_OFF e 9,5% no grupo ATP_ON (p=0,653). Apesar de não se encontrarem diferenças estatisticamente significativas, verificou‐se uma tendência favorável ao grupo ATP_ON, na medida em que este apresentou um aumento mais discreto na percentagem de carga arrítmica, conforme representado na Figura 1.

Figura 1.

Representação gráfica da variação da % de carga arrítmica no grupo ATP_ON e ATP_OFF ao longo do estudo.

(0.06MB).

Para perceber se a presença de algoritmos adicionais de prevenção de taquiarrmitias auriculares traria algum benefício à eficácia do ATP auricular, dividimos os dois grupos em subgrupos, considerando a presença ou ausência de algoritmos preventivos de FA. A análise dos resultados, resumidos na Figura 2, revelou que o algoritmo ATP programado isoladamente foi a programação que obteve menor carga arrítmica no final do follow‐up de 15 meses, e foi também o grupo em que a subida de carga arrítmica foi menor, apesar da ausência de efeitos principais significativos (p=0,967).

Figura 2.

Representação gráfica da variação da % de carga arrítmica em função do tipo de programação das terapias ATP e/ou algoritmos de prevenção.

(0.09MB).

Correlacionando a evolução da percentagem de pacing ventricular com a evolução da carga arrítmica auricular, encontrou‐se uma relação positiva e estatisticamente significativa (r=0,417, p=0,02), indicando que o incremento do pacing ventricular se traduz num aumento significativo da carga arrítmica. O coeficiente de determinação para esta relação foi de 17,4% (Figura 3).

Figura 3.

Representação gráfica da correlação da evolução da % de pacing ventricular com a evolução da % de carga arrítmica.

(0.08MB).

Ao compararmos a percentagem média de pacing ventricular entre os dois grupos verificámos que em M1 foi de 29,47% no grupo ATP_OFF e de 11,34% no grupo ATP_ON (p=0,024), em M2 foi de 30,67% no grupo ATP_OFF e de 12,5% no grupo ATP_ON (p=0,038) e em M3 foi de 34,07% no grupo ATP_OFF e de 14,73% no grupo ATP_ON (p=0,037),conforme representado nas Figuras 4 e 5. O grupo ATP_OFF apresentou assim uma percentagem de pacing ventricular apical significativamente superior quando comparado com o grupo ATP_ON nos três momentos de follow‐up.

Figura 4.

Representação gráfica da variação da % de carga arrítmica em função da variação da % de pacing ventricular no grupo ATP_OFF.

(0.06MB).
Figura 5.

Representação gráfica da variação da % de carga arrítmica em função da variação da % de pacing ventricular no grupo ATP_ON.

(0.06MB).

Quando comparámos a variação da carga arrítmica em função da percentagem de pacing ventricular entre os dois grupos verificámos uma interação marginalmente significativa (p=0,06), indicando que o pacing ventricular é um fator independentemente relacionado e determinante da carga de arritmias auriculares.

Ao compararmos a percentagem média de pacing auricular entre os dois grupos verificámos que, em M1, foi de 62,53% no grupo OFF e de 68,63% no grupo ON (p=0,46), em M2 foi de 65,02% no grupo OFF e de 78,22% no grupo ON (p=0,09) e em M3 foi de 66,05% no grupo OFF e de 77,2% no grupo ON (p=0,22), ou seja, não ocorreram diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos (Figuras 6 e 7). Também não se encontrou nenhuma interação significativa entre o pacing auricular, a carga arrítmica e o ATP (p=0,372), contrariamente ao verificado para o pacing ventricular.

Figura 6.

Representação gráfica da variação da % de carga arrítmica em função da variação da % de pacing auricular no grupo ATP_OFF.

(0.06MB).
Figura 7.

Representação gráfica da variação da % de carga arrítmica em função da variação da % de pacing auricular no grupo ATP_ON.

(0.06MB).

Em termos de eventos clínicos significativos durante o follow‐up, documentaram‐se apenas dois casos de AVC e um caso de insuficiência renal aguda no grupo com ATP OFF, e um caso de óbito por neoplasia no grupo ATP_ON.

Discussão

Estudos anteriormente realizados mostraram que as terapias baseadas em pacing auricular antitaquicardia são uma opção válida e segura para o controle do ritmo em doentes com bradicardia sintomática e necessidade de estimulação artificial, permitindo terminar cerca de 40‐60% das arritmias auriculares, tendo o nosso estudo revelado percentagens médias de sucesso da terapia com ATP auricular ligeiramente superiores a 50%, sem registo de complicações11,13,14,7. Contudo, outros estudos demonstraram que nem o ATP auricular isolado nem associado a algoritmos de prevenção consegue suprimir ou reduzir significativamente a carga arrítmica9,15. Este aspeto foi também observado no nosso estudo, mesmo comparando diversas combinações de programação, não obstante, a tendência favorável identificada no grupo com ATP auricular ativo isoladamente, ou seja, o grupo com a terapia ATP ativa e sem algoritmos de prevenção ativos, foi o que apresentou uma tendência para menor incremento de carga arrítmica, quando comparado com os restantes tipos de programação.

Considerando a literatura existente à data no seu conjunto, é de facto patente a inconsistência em demonstrar benefícios inequívocos à terapia com ATP, em grande medida resultado da enorme heterogeneidade de respostas individuais, o que implica necessariamente que os benefícios clínicos desta modalidade terapêutica não estão disponíveis para uma ampla gama de pacientes, tendo ficado demonstrado nestes estudos que o algoritmo tem, na melhor das hipóteses, eficácia moderada na conversão de taquicardias auriculares regulares e lentas, baixa eficácia em taquicardias auriculares rápidas, sendo ineficaz quando a FA se encontra estabelecida, não permitindo considerar este tipo de terapêutica como primeira linha para o combate da FA paroxística nesta população12,14–16.

No estudo ATTEST, que incluiu 324 doentes, foi colocada a hipótese de que a elevada percentagem de pacing ventricular (VP média=99%) exerce um efeito deletério e limita o beneficio das terapias auriculares, aspeto que sai em parte reforçado com os resultados apresentados, embora de forma não tão robusta, o que poderá ser explicado pela utilização concomitante do algoritmo de minimização de pacing ventricular MVP, resultando em percentagens de pacing abaixo do verificado no estudo ATTEST em ambos os grupos (ATP_ON e ATP_OFF)15.

Não obstante, verificámos que a evolução da carga arrítmica foi significativamente diferente no grupo ATP_ON, revelando este grupo uma taxa de crescimento menor na carga arrítmica, o que é de realçar atendendo a que este grupo apresentou também uma percentagem média de pacing ventricular apical significativamente inferior. Estudos anteriores mostraram também que, em pacientes com DNS e condução AV intacta, percentagens elevadas de estimulação ventricular (VP >40%) aumentam significativamente o risco de internamento por insuficiência cardíaca e FA, tendo ficado também patente no nosso estudo uma correlação significativa e positiva entre a evolução da percentagem de pacing ventricular e a carga arrítmica17,18.

No entanto, e mesmo considerando a menor frequência relativa de estimulação apical do VD no grupo com o algoritmo de ATP ligado, a carga arrítmica ao longo do tempo de follow‐up revelou ainda assim um crescimento, reforçando a teoria de que realmente a dissincronia ventricular imposta por pacing ventricular é deletéria, mas não influencia significativamente o desempenho do algoritmo17 nem constitui provavelmente o único fator de risco para o desenvolvimento de arritmias auriculares nestes doentes.

Adicionalmente, existem evidências de que a taxa de sucesso do ATP é superior nos doentes com terapia imediata comparando com terapia atrasada (59±7% versus 22±5%, p <0,01), embora sem influenciar de forma significativa a carga arrítmica e a sintomatologia10. No nosso estudo, em todos os doentes o parâmetro Episode duration before RX delivery encontrava‐se programado nominalmente com um minuto, pelo que a terapia só foi administrada após este período de tempo e não imediatamente após o início do episódio. Até que ponto este fator pode ter influenciado negativamente o desempenho do ATP auricular permanece por demonstrar e constitui uma limitação.

Por outro lado, existem evidências indicando que o posicionamento do eletrocateter auricular é fundamental para uma otimização do desempenho do algoritmo ATP, com benefício claro para o posicionamento ao nível do septo interauricolar quando comparado com o posicionamento clássico19–21. Atendendo a que todos os nossos doentes tinham eletrocateter posicionado no AAD, a performance global do algoritmo pode estar subvalorizada.

Limitações

O presente estudo incluiu um número reduzido de doentes com as terapias ativas não permitindo estabelecer diferenças em relação a eventuais comorbilidades, taxa de internamentos e mortalidade. O facto de o estudo ser retrospetivo também limitou, de algum modo, os resultados, sobretudo em relação à influência da percentagem de estimulação auricular na carga arrítmica, visto que não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos, não permitindo deste modo estabelecer uma relação estatisticamente relevante entre a carga arrítmica e a percentagem de pacing auricular.

O tempo de seguimento foi também uma das limitações do estudo uma vez que, apesar do estudo incluir tempo de follow‐up superior à maioria dos estudos semelhantes já realizados, um incremento significativo no tempo de follow‐up iria provavelmente acentuar significativamente a tendência revelada no grupo ATP_ON para menor carga arrítmica.

Conclusões

A terapia com pacing auricular antitaquicardia, nos dispositivos utilizados e na população estudada, mostrou‐se eficaz e segura na conversão de episódios de taquiarritmias auriculares. Contudo, o ATP não demonstrou benefícios em termos de carga arrítmica e em termos clínicos. O pacing ventricular apical no VD demonstrou‐se deletério, incrementando significativamente a carga arrítmica, tendo‐se demonstrado uma relação claramente aditiva na evolução da carga arrítmica face à evolução da percentagem de pacing ventricular.

Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animais

Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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