A melhoria de parâmetros hemodinâmicos justifica o uso do balão intra‐aórtico (BIA) em doentes com enfarte agudo do miocárdio (EAM) complicado por choque cardiogénico. Esta revisão sistemática da Cochrane avaliou o potencial impacto desta intervenção na mortalidade. Foram avaliados sete ensaios clínicos aleatorizados e controlados com um total de 790 doentes (quatro estudos utilizando a terapêutica médica como comparador e três estudos compararam o BIA com outros dispositivos de assistência ventricular). O uso de BIA não reduziu significativamente a mortalidade a curto ou a longo prazo nos doentes com EAM e choque cardiogénico. Não existe evidência que suporte o seu uso sistemático nestes doentes.
Improvement of hemodynamic parameters is the rationale for the use of intra‐aortic balloon pump counterpulsation (IABP) in patients with cardiogenic shock following acute myocardial infarction (MI). This Cochrane systematic review evaluated the impact of this intervention in reducing mortality. Seven randomized controlled trials with a total of 790 patients were included (four using medical therapy as a comparator, and three comparing IABP with other ventricular assist devices). IABP did not reduce mortality in either the short or long term. Therefore, the systematic use of IABP in patients with cardiogenic shock following MI cannot be recommended.
Unverzagt S, Buerke M, de Waha A, Haerting J, Pietzner D, Seyfarth M, Thiele H, Werdan K, Zeymer U, Prondzinsky R. Intra‐aortic balloon pump counterpulsation (IABP) for myocardial infarction complicated by cardiogenic shock. Cochrane Database of Systematic Reviews 2015, Issue 3. Art. No.: CD007398. DOI: 10.1002/14651858.CD007398.pub3.
Qual o impacto prognóstico da utilização do balão intra‐aórtico (BIA) em doentes com enfarte agudo do miocárdio (EAM) complicado por choque cardiogénico1?
ObjetivosAvaliar a eficácia e segurança do BIA comparativamente com estratégias que não utilizam este dispositivo em doentes com EAM e choque cardiogénico.
Tipo e descrição do estudoFoi realizada uma revisão sistemática que incluiu ensaios clínicos controlados e aleatorizados (RCT) que avaliaram doentes com EAM complicado por choque cardiogénico1. Foram considerados todos os RCT que avaliassem o uso de BIA comparativamente com regimes terapêuticos alternativos (que podiam incluir outros dispositivos de assistência ventricular).
Em outubro de 2013 foram pesquisadas as bases de dados de Ensaios Clínicos da Cochrane Library (CENTRAL), assim como a MEDLINE, EMBASE, LILACS, IndMed, KoreaMed e registos internacionais de ensaios clínicos.
Os resultados dos estudos foram agregados em meta‐análises. As variáveis dicotómicas associadas ao tempo (time to event) foram expressas através de hazard ratio (HR) e respetivo intervalo de confiança 95% (IC 95%), e as variáveis dicotómicas puras foram expressas através de odds ratio (OR) e respetivo IC 95%.
ResultadosForam incluídos na revisão sistemática 7 RCT com um total de 790 doentes (406 no grupo experimental e 384 no grupo de controlo), quatro estudos comparando BIA com terapêutica standard e três estudos comparando BIA com outros dispositivos de assistência ventricular (dois com TandemHeart® e um com Impella®).
Todos os estudos foram conduzidos sem ocultação das intervenções para as quais os doentes tinham sido alocados. Nestes ensaios clínicos todos os doentes foram revascularizados: 95% com angioplastia primária e 5% com fibrinolíticos. O tempo médio de suporte hemodinâmico com o BIA foi de 59 horas.
A proporção de eventos letais aos 30 dias foi aproximadamente 40%. A análise agregada dos ensaios clínicos não demonstrou benefício da utilização do BIA na mortalidade a 30 dias após o evento índice (HR 0,95; IC 95%: 0,76‐1,19) (Figura 1). O risco de morte aos seis meses também foi similar às outras estratégias (OR 0,96; IC 95%: 0,71‐1,30).
Risco de morte a 30 dias com a utilização do BIA. Adaptado de: Unverzagt et al.1. BIA: balão intra‐aórtico; DAV: dispositivos de assistência ventricular; HR: hazard ratio; IC 95%: intervalo de confiança de 95%; RCT: ensaios clínicos controlados e aleatorizados.
Durante o internamento, 15 de 364 (4,12%) doentes do grupo experimental apresentaram eventos adversos graves (reenfarte ou acidente vascular cerebral [AVC]), comparando com cinco de 363 (1,38%) do grupo de controlo.
ConclusõesA melhor evidência disponível, baseada nos RCT, não suporta o uso sistemático do BIA em doentes com choque cardiogénico secundário a EAM com o intuito de melhorar o prognóstico vital.
ComentárioO choque cardiogénico complica 5‐7% dos EAM apresentando taxas de mortalidade muito elevadas2. Trata‐se de um contexto clínico muito desfavorável, em que a evidência é escassa e apenas a revascularização coronária mostrou reduzir a mortalidade de forma significativa aos seis meses3.
A insuflação diastólica do BIA, no segmento torácico da artéria aorta, apresentava argumentos fisiológicos que prediziam a melhoria de alguns parâmetros hemodinâmicos com potencial impacto prognóstico, nomeadamente a melhoria do fluxo coronário, a diminuição da pós‐carga e a melhoria do índice cardíaco. Tal como todas as intervenções em saúde, o seu uso sistemático deve basear‐se em estudos metodologicamente robustos. Neste caso, o BIA não mostrou ser eficaz na redução da mortalidade a curto ou a longo prazo, na análise agregada de dados de ensaios clínicos1,4. Em relação aos eventos adversos classicamente associados ao BIA (AVC, isquemia crítica de artérias periféricas, hemorragia ou sépsis), o estudo mais robusto (IABP‐SHOCK II) não mostrou diferenças significativas entre esta intervenção e terapêutica médica5.
Deve‐se alertar que a avaliação global do efeito do BIA promovida por esta revisão sistemática é limitada por alguns fatores: a ausência de ocultação em relação às terapêuticas alocadas nos ensaios clínicos, a existência de estudos com amostras de pequena dimensão e elevada taxa de crossover e a presença de doentes já com BIA antes da inclusão nos estudos.
Implicações clínicasAs normas de orientação clínica da Sociedade Europeia de Cardiologia vigentes para o EAM com supradesnivelamento do segmento ST referem que a utilização do BIA pode ser considerado (recomendação IIb, nível de evidência B) nos doente com EAM complicado com choque cardiogénico6. Os outros dispositivos de assistência ventricular (de uma forma geral, sem especificar) apresentam o mesmo nível de recomendação (IIb) com nível de evidência inferior (nível de evidência C)6.
As normas de orientação americanas (conjuntas da American College of Cardiology Foundation e American Heart Association) apresentam uma recomendação IIa (nível de evidência B) para os doentes com EAM e choque cardiogénico que permaneçam instáveis sob terapêutica médica7.
Desta forma, este dispositivo apresenta um papel secundário no tratamento destes doentes e a sua utilização por rotina não deve ser recomendada, uma vez que não existe um benefício claro da intervenção.
Responsabilidades éticasProteção de pessoas e animaisOs autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.
Confidencialidade dos dadosOs autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.
Direito à privacidade e consentimento escritoOs autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.
Conflito de interessesOs autores declaram não haver conflito de interesses.