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Vol. 33. Núm. 3.
Páginas 137-138 (março 2014)
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Abordagem multimarcadores na estratificação de risco dos doentes com síndrome coronária aguda: rumo à estratificação ideal
Multimarker approach in risk stratification of patients with acute coronary syndromes: Towards the ideal stratification
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Doroteia Silvaa,b
a Serviço de Cardiologia I, Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte, Lisboa, Portugal
b Clínica Universitária de Cardiologia, Faculdade de Medicina de Lisboa, Lisboa, Portugal
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Catarina Vieira, Sérgio Nabais, Vítor Ramos, Carlos Braga, António Gaspar, Pedro Azevedo, Miguel Álvares Pereira, Nuno Salomé, Adelino Correia
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À semelhança de outras patologias cardiovasculares, ao longo do tempo o avanço no conhecimento biopatológico da síndrome coronária aguda (SCA) traduziu‐se no aparecimento de novos biomarcadores, isto é, moléculas plasmáticas passíveis de quantificação, que traduzem diferentes mecanismos fisiopatológicos subjacentes a esta condição.

Tratam‐se de ferramentas valiosas, utilizadas não só no diagnóstico cada vez mais precoce da doença, bem como na sua estratificação prognóstica a curto e longo prazo.

Dispomos na atualidade de uma vasta gama de biomarcadores na SCA: marcadores que refletem a atividade inflamatória vascular aterogénica (tal como a proteína C reativa de alta sensibilidade [PCR‐as]), marcadores da atividade proteásica associada à progressão da aterosclerose e à destabilização da placa de ateroma (o caso da cistatina C), outros traduzindo a lesão miocárdica (como a troponina, o ST2), a lesão renal (cistatina C, NGAL, taxa de filtração glomerular), a disfunção ventricular/miocitária (os péptidos neuro‐hormonais, como o NT‐proBNP, a adrenomedulina, a copeptina), e outros ainda, tal como o Red blood cell Distribuition Witdh (RDW), que constituem marcadores de mecanismos múltiplos simultâneos. Dada a complexidade da fisiopatologia da SCA, a combinação de vários biomarcadores, em detrimento da sua utilização singular, apresenta‐se como uma alternativa muito atrativa a investigar.

A utilização conjunta de marcadores de risco traduziu‐se, assim, no aparecimento de sistemas de pontuação de risco, alguns dos quais já bem validados e amplamente utilizados por nós. Ainda que, inicialmente, apenas tivessem sido incluídos marcadores de risco clínicos (tal como ocorreu no score TIMI), eles foram progressivamente englobando outro tipo de marcadores, tal como os biomarcadores plasmáticos (já referidos), no sentido de aumentar a acuidade do seu desempenho. Estes scores permitem‐nos estratificar o risco do nosso doente individualmente considerado e, desta forma, atuar em conformidade com o risco previsto. Para doentes de risco mais elevado exigem‐se terapêuticas mais agressivas, tal como no caso considerado da SCA sem elevação do segmento ST, a terapêutica de revascularização coronária precoce1.

Quais os biomarcadores ideais a selecionar ou qual a combinação perfeita de biomarcadores são questões que permanecem em aberto.

O estudo de Vieira et al.2, publicado nesta edição, baseou‐se nesta premissa. Ele teve como objetivo principal avaliar o valor de uma abordagem de multimarcadores na estratificação de risco dos doentes admitidos por SCA. Como biomarcadores foram selecionados a cistatina C, o NT‐proBNP, a PCR e o RDW, não só porque individualmente eles já demonstraram valor prognóstico na SCA3–10, como também pela sua exequibilidade de utilização na prática clínica diária, facto que se revela de extrema importância.

Várias conclusões muito interessantes se inferem da leitura deste estudo.

Em primeiro lugar, a abordagem multimarcadores baseada na determinação destas quatro moléculas foi preditora independente de mortalidade aos seis meses (morte por qualquer causa), inclusive no modelo multivariável que incluiu o já bem validado score GRACE. Doentes com quatro biomarcadores elevados na admissão apresentaram um risco de mortalidade 14 vezes superior aos doentes com apenas um ou nenhum biomarcador elevado. Mais ainda, esta abordagem proporcionou informação prognóstica adicional ao score GRACE, reestratificando os doentes não só de alto risco (no caso da SCA sem e com elevação do segmento ST), como também os de risco intermédio que se apresentaram com SCA sem elevação de ST. Este grupo específico de doentes, na presença dos quatro biomarcadores elevados, apresentou uma taxa de mortalidade aos seis meses de 40% (versus 0% se apenas um, dois ou três marcadores aumentados), recolocando‐os numa categoria de alto risco e obrigando‐nos desta forma a questionar a adequação da nossa atitude terapêutica.

Em segundo lugar, e no seguimento de outros estudos, individualmente a cistatina C e o NT‐proBNP foram os preditores de mortalidade mais fortes (sem diferença significativa entre eles), seguido da PCR (determinada por métodos convencionais e não por métodos de alta sensibilidade, como seria desejável) e do RDW.

Para terminar, e não menos importante, saliento a constatação de que, à semelhança do que se verificou em outros estudos ou registos prévios – o denominado paradoxal treatment11 – os doentes de risco mais elevado (com um score de biomarcadores mais alto) apresentaram uma percentagem de tratamento invasivo mais baixo, contrariando as recomendações atuais.

Algumas limitações existem neste estudo, bem referidas no final pelos autores, e das quais saliento o facto de se tratar de um estudo prospetivo observacional não aleatorizado, unicêntrico e logo com uma taxa baixa de eventos, apenas com uma avaliação no tempo dos biomarcadores, em detrimento de uma determinação seriada que nos permitisse avaliar a evolução temporal da informação obtida.

Estamos longe, mas rumo à estratificação de risco ideal na SCA. Esperamos que esta estratificação cada vez mais rigorosa se traduza no dia‐a‐dia por abordagens terapêuticas também elas mais rigorosas, tendo como objetivo primordial o tratamento ideal para todos os nossos doentes.

Conflito de interesses

O autor declara não haver conflito de interesses.

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