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Vol. 34. Núm. 12.
Páginas 745-751 (dezembro 2015)
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Vol. 34. Núm. 12.
Páginas 745-751 (dezembro 2015)
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Alterações eletrocardiográficas na população adulta de cidade do sul do Brasil: estudo populacional
Electrocardiographic changes in adults living in a southern Brazilian city: A population‐based study
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Fábio Jean Goulart Sebolda, Fabiana Schuelter‐Trevisolb,c, Leandro Nakashimaa, Afonso Possamai Della Júniora, Márcia Regina Pereiraa, Daisson José Trevisolb,c,
Autor para correspondência
daissont@uol.com.br

Autor para correspondência.
a Curso de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil
b Programa de Pós‐Graduação em Ciências da Saúde da Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil
c Centro de Pesquisas Clínicas do Hospital Nossa Senhora da Conceição e da Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil
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Tabelas (2)
Tabela 1. Alterações encontradas nos laudos de ECG [(n=73)
Tabela 2. Características sociodemográficas e clínicas relacionadas ao ECG
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Resumo
Introdução e objetivos

Anormalidades em um eletrocardiograma (ECG) de repouso são fatores preditores de mortalidade e eventos cardiovasculares entre adultos assintomáticos. Estimar a prevalência de anormalidades eletrocardiográficas em adultos e possível associação com fatores de risco.

Métodos

Estudo transversal que avaliou adultos com idade entre 19‐59 anos, provenientes do município de Tubarão (SC). A colheita dos dados ocorreu entre novembro de 2011 a julho de 2012. Os laudos eletrocardiográficos foram classificados de acordo com a diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Análise e Emissão de Laudos Eletrocardiográficos e divididos em anormalidades maiores, anormalidades menores e sem alterações, conforme estudos anteriores. Para a associação do ECG com os tradicionais fatores de risco cardiovasculares foi utilizado o método qui‐quadrado de Pearson ou ANOVA.

Resultados

Foram estudados 361 participantes, a média de idade foi de 40,4 (DP=12,2) anos e 232 (64,3%) eram mulheres. Verificou‐se 16,9% de anormalidades menores e 3,3% de anormalidades maiores. Dentre os fatores de risco estudados, sexo, tabagismo, alcoolismo, hipertensão arterial sistémica, diabetes mellitus, e maior score de risco de Framingham (ERF) estiveram associados significativamente às alterações maiores e menores do ECG.

Conclusões

Houve prevalência de 20,2% de alterações eletrocardiográficas na população estudada, sendo a maioria de anormalidades menores. As anormalidades eletrocardiográficas maiores e menores tiveram associações significativas com fatores de risco de doença arterial coronária, podendo este exame predizer risco cardiovascular em populações adultas assintomáticas.

Palavras‐chave:
Fatores de risco
Doenças cardiovasculares
Eletrocardiografia
Abstract
Introduction and Objectives

Abnormalities on the resting electrocardiogram (ECG) are predictors of mortality and cardiovascular events among asymptomatic adults. The aim of this study was to estimate the prevalence of ECG abnormalities in adults and their association with cardiovascular risk factors.

Methods

We performed a cross‐sectional analysis of ECGs in adults aged 19‐59 years, living in Tubarão, Santa Catarina, Brazil. Data were collected between November 2011 and July 2012. Electrocardiographic findings were classified according to the guidelines of the Brazilian Society of Cardiology on analyzing and issuing electrocardiographic reports, and were divided into major abnormalities, minor abnormalities and no changes, as in previous studies. Pearson's chi‐square test and ANOVA were used to analyze the association of ECG parameters with traditional cardiovascular risk factors.

Results

A total of 361 participants were studied. Mean age was 40.4±12.2 years; 232 (64.3%) were women. Minor abnormalities were found in 16.9% and major abnormalities in 3.3%. Among the risk factors examined, gender, smoking, alcohol consumption, systemic hypertension, diabetes, and high Framingham risk score were significantly associated with major and minor ECG changes.

Conclusions

The prevalence of electrocardiographic changes was 20.2% in the population surveyed, the majority being minor. Both major and minor electrocardiographic abnormalities showed significant associations with risk of coronary artery disease, and may predict cardiovascular risk in asymptomatic adults.

Keywords:
Risk Factors
Cardiovascular diseases
Electrocardiography
Texto Completo
Introdução

As doenças cardiovasculares (DCV) são responsáveis por altas taxas de morbilidade e mortalidade nos países desenvolvidos, e constituem a primeira causa de mortalidade proporcional no Brasil desde a década de 1960. No ano de 2008, as DCV corresponderam a 31,8% da taxa de mortalidade proporcional no país e a 38% dos óbitos registados no município de Tubarão, Santa Catarina1.

As DCV acarretam elevados gastos com saúde, envolvendo grande parte da população economicamente ativa. O choque económico das DCV no Brasil pode ser aferido por intermédio das seguintes informações: esse grupo de doenças é responsável por 65% dos óbitos na população adulta entre 30‐69 anos de idade, causa de 14% dos internamentos nessa faixa etária (1150000 internamentos/ano) e é também responsável por 40% das aposentações precoces2. As DCV são multifatoriais e sua prevenção está condicionada ao controle dos chamados fatores de risco (tabagismo, obesidade, dislipidemias, hipertensão arterial sistémica [HAS], sedentarismo e diabetes mellitus [DM])3–5.

Anormalidades no eletrocardiograma (ECG) de repouso estão associadas como fator independente para o surgimento de doença arterial coronária (DAC) e as relacionaram com aumento de taxa de mortalidade e de risco para DCV6–10. Ondas Q anormais no ECG podem indicar um enfarte do miocárdio silencioso ou clinicamente não reconhecido. No estudo de Framingham, um quarto dos enfartes não fatais foram encontrados somente pela deteção de mudanças eletrocardiográficas11–13.

Diante desta situação, além da anamnese e exame clínico, o ECG também pode ser empregado na epidemiologia cardiovascular, devido a seu baixo custo, fácil acesso, segurança de uso e sua capacidade de predizer risco cardiovascular8,10.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi estimar a prevalência de anormalidades maiores e menores do ECG e sua associação com os principais fatores de risco para DAC em população adulta de Tubarão, Santa Catarina.

Métodos

Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) sob o protocolo 11.130.4.01.III, teve auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (FAPESC) e é decorrente do projeto Estudo da Saúde do Adulto de Tubarão (ESATU), numa parceria entre o Centro de Pesquisas Clínicas do Hospital Nossa Senhora da Conceição, Unisul e Secretaria Municipal de Saúde.

Foi realizado um estudo epidemiológico com delineamento transversal, de base populacional, no período entre novembro de 2011 e junho de 2012, incluindo participantes adultos, portanto, na faixa etária entre 19‐59 anos de idade, de ambos os sexos, residentes no município de Tubarão, Santa Catarina. Foram excluídos do estudo gestantes, indivíduos sem condições de deslocamento ao local de colheita dos dados ou que não tivessem autonomia para decidir sobre sua participação, e aqueles que não realizaram o ECG ou exames laboratoriais.

Considerando que a população adulta em Tubarão era de 62537 pessoas (censo 2010), utilizou‐se a uma estimativa de 36%8 de alterações eletrocardiográficas, com nível de significância de 5% e margem de erro de 1%, resultando em amostra mínima de 353 indivíduos para um nível de confiança de 95%.

Os participantes foram selecionados a partir de amostragem aleatória simples, segundo os números da residência cadastrados em cada uma das 250 microáreas do município, registadas nas 27 unidades de estratégia de saúde da família (ESF). Cada microárea possui um agente comunitário de saúde para realizar visitas domiciliares periódicas e a taxa de cobertura é estimada em 90% da população residente. Os domicílios sorteados foram: quatro, 36, 27, 10 e 32. O agente comunitário de saúde de cada microárea se dirigia a primeira casa sorteada (número quatro) e convidava o residente a participar do estudo, de acordo com os critérios de inclusão e exclusão. Caso não houvesse adultos no domicílio ou estes não aceitassem participar do estudo, seguia‐se para a casa subsequente sorteada (número dez) até que cada agente comunitário recrutasse de um a dois participantes por microárea.

A colheita de dados aconteceu aos sábados, no período matutino, em ambulatórios médicos nas dependências do Hospital Nossa Senhora da Conceição, em consultas pré‐agendadas aos participantes sorteados. Foi solicitada a comparência do paciente em jejum de 12 horas e que se evitasse o consumo de bebidas alcoólicas nas 72 horas anteriores a consulta.

Os participantes, mediante anuência do termo de consentimento livre e esclarecido, foram submetidos à entrevista e o instrumento continha dados sociodemográficos (idade, sexo e escolaridade – sendo esta última analisada em anos completos de estudo), dados comportamentais (sedentarismo, alcoolismo e tabagismo) e clínicos (histórico de DCV e uso de medicamentos). Foram considerados como fumadores os indivíduos que fumaram 100 ou mais cigarros durante toda sua vida14. Entre os adultos que afirmaram consumir álcool, foi aplicado o questionário CAGE15. Para aferição do nível de atividade física utilizou‐se o Questionário Internacional de Atividade Física, versão curta16,17.

Foram realizadas as aferições das medidas antropométricas (altura, peso) para determinação do índice de massa corporal (IMC), sendo considerado obesos indivíduos com IMC ≥30kg/m2. Foram coletados 10mL de sangue venoso periférico para dosagem de colesterol total, lipoproteína de alta densidade (HDL), lipoproteína de baixa densidade (LDL), triglicerídeos (TG), glicemia e creatinina.

A determinação das dislipidemias envolveu as alterações de forma isolada ou em conjunto dentre os quatro parâmetros dosados. Hipercolesterolemia isolada – LDL ≥160mg/dL; hipertrigliceridemia isolada – TG ≥150mg/dL; hiperlipidemia mista inclui valores aumentados de LDL ≥160mg/dL e TG ≥150mg/dL; e redução dos níveis de HDL (<40mg/dL em homens e <50mg/dL em mulheres) isoladamente ou em associação com o aumento de LDL ou TG3.

A HAS foi avaliada utilizando os critérios propostos pela Sociedade Brasileira de Cardiologia, em sua diretriz da hipertensão do ano de 2010, que consiste na realização de três medidas de PA com intervalo de um minuto entre cada aferição, com o equipamento OMRON HEM‐742INT18. Pacientes com HAS foram classificados quando apresentaram a média das aferições de pressão arterial sistólica e diastólica com resultados ≥140 ou ≥90mmHg, respetivamente, ou o uso de medicamentos anti‐hipertensivos. Foram considerados pacientes com DM aqueles com diagnóstico prévio, ou em uso de medicação hipoglicemiante, ou com glicemia de jejum superior a 126mg/dL. Os participantes foram estratificados em três categorias, de acordo com o risco calculado segundo o score de risco Framingham (ERF): baixo risco (<10%), risco intermediário (entre 10‐20%) e alto risco (>20%)19.

O ECG foi realizado por meio do eletrocardiógrafo digital C10+. O exame foi realizado com o indivíduo em repouso, em decúbito dorsal; os registos posteriormente foram enviados para um médico cardiologista que estabeleceu os diagnósticos, de acordo com a diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Análise e Emissão de Laudos Eletrocardiográficos20. Esses dados foram divididos em anormalidades maiores, anormalidades menores e sem alterações conforme estudos anteriores6–10.

Foram consideradas alterações da repolarização ventricular quando houve modificações significativas na polaridade, duração e na morfologia do ponto J, segmento ST, onda T e onda U. Estas alterações não se enquadravam na definição de ondas isquémicas e nem houve presença de outras características diagnósticas específicas, como as das sobrecargas cavitárias ou bloqueios intraventriculares. O aumento do intervalo QT corrigido foi colocado como modificação separada destas anteriores. Já a isquemia subepicárdica foi atribuída à presença de onda T negativa, simétrica e pontiaguda20.

Para o cálculo de tamanho de amostra foi utilizado o programa OpenEpi versão 2.3.1. Os dados foram inseridos no programa Epidata versão 3.1 (EpiData Association, Odense, Dinamarca) e a análise estatística foi realizada no software Statistical Package for Social Sciences (SPSS for Windows v 19; Chicago, IL, EUA). Os dados foram descritos com emprego da estatística descritiva, frequência e medidas de tendência central e dispersão. Para se verificar associação entre as variáveis de interesse, foi aplicado teste de qui‐quadrado de Pearson ou teste ANOVA de uma via, com nível de confiança de 95%.

Resultados

Foram estudados 361 participantes, com média de idade de 40,4 anos; 232 (64,3%) eram mulheres e 312 (86,4%) eram brancos.

Foram considerados portadores das anormalidades menores 61 indivíduos (16,9%). Doze (3,3%) possuíam anormalidades maiores e 288 (79,8%) tiveram o ECG normal. Na Tabela 1 apresentam‐se as alterações eletrocardiográficas encontradas entre os participantes.

Tabela 1.

Alterações encontradas nos laudos de ECG [(n=73)

Anormalidades menores  n=61 
Alterações da repolarização ventricular  21 
Distúrbio de condução pelo ramo direito  13 
Bradicardia sinusal 
Bloqueio divisional ântero‐superior 
Repolarização precoce 
Desvio de eixo para esquerda 
Ritmo juncional 
Extrassístoles ventriculares monomórficas isoladas 
Bloqueio atrioventricular de primeiro grau 
Anormalidades maiores  n=12 
Isquemia subepicárdica inferior 
PR curto e presença de onda delta sugerem síndrome de Wolff‐Parkinson‐White 
Cicatriz de enfarte inferior 
Cicatriz de enfarte ântero‐septal 
Cicatriz de enfarte septal 
Repolarização precoce V1 V6, possível sobrecarga biatrial 
Bloqueio divisional ântero‐superior, bloqueio de ramo direito 
Isquemia subepicárdica ântero‐septal 
Cicatriz de enfarte e isquemia subepicárdica inferior 

Na Tabela 2 são apresentadas as características sociodemográficas, clínicas e as morbilidades em relação à análise eletrocardiográfica.

Tabela 2.

Características sociodemográficas e clínicas relacionadas ao ECG

Características  Totaln=361  Normaln=288  ECGmenorn=61  Maiorn=12  p* 
Idade (média±DP)  40,4±12,3  40,0±12,0  41,0±13,5  47,2±10,3  0,133 
Sexo          0,037 
Feminino  232 (64,3)  194 (67,4)  33 (54,1)  5 (41,7)   
Masculino  129 (35,7)  94 (32,6)  28 (45,9)  7 (58,3)   
Anos de estudo (média±DP)  8,8±4,3  9,0±4,3  8,4±4,2  7,6±3,4  0,403 
Fumadores          0,002 
Sim  112 (31,0)  82 (28,5)  21 (34,4)  9 (75,0)   
Não  249 (69,0)  206 (71,5)  40 (65,6)     
Consumidores de álcool          <0,001 
Sim  29 (8,0)  20 (6,9)  4 (6,6)  5 (41,7)   
Não  332 (92,0)  268 (93,1)  57 (93,4)  7 (58,3)   
Atividade física          0,842 
Sedentários  219 (60,7)  173 (60,1)  39 (63,9)  7 (58,3)   
Fisicamente ativos  142 (39,3)  115 (39,9)  22 (36,1)  5 (41,7)   
HAS          0,044 
Sim  136 (37,7)  101 (35,1)  27 (44,3)  8 (66,7)   
Não  225 (62,3)  187 (64,9)  34 (55,7)  4 (33,3)   
DM          0,019 
Sim  22 (6,1)  15 (5,2)  4 (6,6)  3 (25,0)   
Não  339 (93,9)  273 (94,8)  57 (93,4)  9 (75,0)   
Obesidade          0,552 
Sim  98 (27,1)  75 (26,0)  20 (32,8)  3 (25,0)   
Não  263 (72,9)  213 (74,0)  41 (67,2)  9 (75,0)   
Dislipidemia          0,753 
Sim  233 (64,9)  185 (64,7)  39 (63,9)  9 (75,0)   
Não  126 (35,1)  101 (35,3)  22 (36,1)  3 (25,0)   
Framingham**          0,004 
Médio, alto risco  18 (5,1)  11 (3,9)  4 (6,6)  3 (25,0)   
Baixo risco  335 (94,9)  269 (96,1)  57 (93,4)  9 (75,0)   

χ2: qui‐quadrado; DP: desvio padrão; ECG: eletrocardiograma; HAS: hipertensão arterial sistémica; DM: diabetes mellitus.

*

Qui‐quadrado ou ANOVA.

**

Score de risco de Framingham.

Os resultados da análise mostram que as anormalidades maiores e menores, na sua maioria, estavam associadas a mulheres, fumadores, consumidores de álcool, hipertensos, diabéticos e os que foram classificados em médio e alto risco, segundo o ERF.

Discussão

Nessa pesquisa, as anormalidades menores (16,9%) mostraram‐se mais prevalentes que as anormalidades maiores (3,3%), sendo que estes resultados percentuais são menores que estudos populacionais realizados em americanos8–10. Um estudo americano com 14749 mulheres na faixa etária entre 40‐55 anos encontrou 27,8% de anormalidades menores e 6,3% de anormalidades maiores10. Quando avaliados pacientes idosos, um estudo americano que envolveu 2192 indivíduos com idade entre 70‐79 anos encontrou 13% dos participantes com anormalidades menores e 23% dos participantes com anormalidades maiores. As diferenças de prevalências observadas podem ser explicadas pela diferença etária, pois no presente estudo foram avaliados pacientes de 18‐59 anos com média de idade de 40,4 anos.

Com relação às alterações no ECG, o sexo feminino apresentou maior prevalência de alterações menores e os homens alterações maiores. Um estudo conduzido em São Paulo, no Brasil, em adultos atendidos em unidades básicas de saúde, também encontrou maior proporção de alterações eletrocardiográficos entre os homens21.

Participantes fumadores e ex‐fumadores apresentaram associação positiva com a presença de alterações no ECG. Resultados de outros estudos também evidenciaram a associação do tabagismo com as anormalidades do ECG10,22,23. Oliveira et al. mostraram que adultos com menos de 45 anos, que fumam mais do que 25 cigarros por dia, têm um risco aumentado de enfarte agudo do miocárdio em relação a quem nunca fumou24.

Neste estudo, 37,7% da população foi considerada hipertensa. Dados nacionais apontam variação entre 20‐45% de indivíduos hipertensos25–28. A hipertensão é o fator de risco mais associado a anormalidades eletrocardiográficas, principalmente com alterações do segmento ST‐T8,9. Greenland et al. evidenciaram que com a manutenção dessa alteração o risco de DAC subirá de 38 para 67% ao longo de cinco anos9.

Na população estudada, apenas 5% da população foi alocada nos grupos de médio e alto risco do ERF e 38,9% destes pacientes com médio e alto risco tiveram anormalidades eletrocardiográficas, quando somadas as anormalidades maiores e menores. Um estudo americano encontrou anormalidades eletrocardiográficas em 54,7% dos pacientes que possuíam alto risco pelo ERF, o que comprova que o score é um bom preditor de risco cardiovascular em adultos8.

Quando comparados os indivíduos diabéticos com algum tipo de anormalidade, 31,8% apresentaram anormalidades maiores ou menores no ECG. Brollo et al. avaliaram 1042 indivíduos e não houve significância estatística quando compararam áreas de cicatriz de enfarte no ECG entre diabéticos e não diabéticos de nipo‐brasileiros provindos do Japão. Entretanto, entre os nascidos no Brasil, houve tendência ao surgimento de anormalidade do ECG e a cicatriz de enfarte estava presente em 7,5% dos diabéticos, dado que corrobora o resultado do estudo29.

No presente estudo houve associação entre alcoolismo e alterações eletrocardiográficas, enquanto outros estudos não relataram essa associação7,8,10. Os resultados controversos podem ser explicados pela difícil quantificação do consumo alcoólico. Nesta pesquisa, foi utilizado o questionário CAGE, um questionário prático e viável em estudo populacionais para a triagem do abuso de álcool, mas por sua simplicidade, a mensuração da gravidade da doença alcoólica não é adequada15.

Não houve associação entre dislipidemias e anormalidades no ECG, apesar de estar estabelecida a associação em diversos estudos em vários países8,10,30. Um estudo americano relatou que, entre os indivíduos com alteração eletrocardiográfica, 25,7% possuíam LDL elevado, e dos que não possuíam nenhuma alteração eletrocardiográfica, 24,7% possuíam LDL elevado, não havendo diferença estatisticamente significativa31. Denes et al. observaram relação de anormalidades eletrocardiográficas em mulheres tratadas para dislipidemia10.

Com relação as limitações do estudo, pode‐se apontar que a amostra estudada não foi calculada para realização de análise de subgrupos, o que permitiria avaliar os fatores de risco de DAC e cada anormalidade eletrocardiográfica específica. Além disso, comparação dos resultados foi realizada com estudos de diferente método de leitura e classificação dos ECG, como, por exemplo, um estudo americano que classificou o ECG utilizando os critérios de Minnesota8,32. Além disso, os laudos foram realizados por um único médico cardiologista, não sendo calculada concordância intraobservador e interobservador. Literaturas prévias demonstram variações na leitura entre diferentes indivíduos que podem impedir a precisão dos laudos do ECG33.

Contudo, há poucos estudos brasileiros que apresentam a prevalência de alterações eletrocardiográficas na população em geral. Como descrito anteriormente, trata‐se de um estudo importante para saúde pública, especialmente por se tratar de um exame simples, disponível à população e muito importante na triagem e deteção de anormalidades cardíacas, permitindo a intervenção médica antes de desfechos fatais.

Conclusões

Dos 361 adultos estudados, 61 indivíduos (16,9%) apresentaram alterações eletrocardiográficas menores e 12 (3,3%) maiores.

Em conclusão, os resultados mostraram que os fatores sexo feminino, tabagismo, alcoolismo, hipertensão, diabetes e ERF médio a alto foram fatores associados positivamente a anormalidades eletrocardiográficas, e alguns destes são modificáveis.

Dado a sua segurança, o baixo custo e a ampla disponibilidade, os dados eletrocardiográficos podem ser úteis para predizer risco cardiovascular na população em geral.

Responsabilidades éticasProteção dos seres humanos e animais

Os autores declaram que os procedimentos seguidos estavam de acordo com os regulamentos estabelecidos pelos responsáveis da Comissão de Investigação Clínica e Ética e de acordo com os da Associação Médica Mundial e da Declaração de Helsinki.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência deve estar na posse deste documento.

Financiamento

Este estudo foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (FAPESC).

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Agradecimentos

Agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina por viabilizar este estudo, ao Laboratório Santa Catarina e ao Centro de Pesquisas Clínicas do Hospital Nossa Senhora da Conceição.

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