Peter K. Smith, M.D., John D. Puskas, M.D., Deborah D. Ascheim, M.D., Pierre Voisine, M.D., Annetine C. Gelijns, Ph.D., Alan J. Moskowitz, M.D., Judy W. Hung, M.D., Michael K. Parides, Ph.D., Gorav Ailawadi, M.D., Louis P. Perrault, M.D., Michael A. Acker, M.D., Michael Argenziano, M.D., Vinod Thourani, M.D., James S. Gammie, M.D., Marissa A. Miller, D.V.M., Pierre Pagé, M.D., Jessica R. Overbey, M.S., Emilia Bagiella, Ph.D., François Dagenais, M.D., Eugene H. Blackstone, M.D., Irving L. Kron, M.D., Daniel J. Goldstein, M.D., Eric A. Rose, M.D., Ellen G. Moquete, R.N., Neal Jeffries, Ph.D., Timothy J. Gardner, M.D., Patrick T. O’Gara, M.D., John H. Alexander, M.D., and Robert E. Michler, M.D. for the Cardiothoracic Surgical Trials Network Investigators N Engl J Med 2014;371:2178‐88.
Background: Ischemic mitral regurgitation is associated with increased mortality and morbidity. For surgical patients with moderate regurgitation, the benefits of adding mitral‐ valve repair to coronary‐artery bypass grafting (CABG) are uncertain.
Methods: We randomly assigned 301 patients with moderate ischemic mitral regurgitation to CABG alone or CABG plus mitral‐valve repair (combined procedure). The primary end point was the left ventricular end‐systolic volume index (LVESVI), a measure of left ventricular remodeling, at 1 year. This end point was assessed with the use of a Wilcoxon rank‐sum test in which deaths were categorized as the lowest LVESVI rank.
Results: At 1 year, the mean LVESVI among surviving patients was 46.1±22.4ml per square meter of body‐surface area in the CABG‐alone group and 49.6±31.5ml per square meter in the combined‐procedure group (mean change from baseline, −9.4 and −9.3ml per square meter, respectively). The rate of death was 6.7% in the combined‐procedure group and 7.3% in the CABG‐alone group (hazard ratio with mitral‐valve repair, 0.90; 95% confidence interval, 0.38 to 2.12; p=0.81). The rank‐based assessment of LVESVI at 1 year (incorporating deaths) showed no significant between‐group difference (z score, 0.50; p=0.61). The addition of mitral‐valve repair was associated with a longer bypass time (p <0.001), a longer hospital stay after surgery (p=0.002), and more neurologic events (p=0.03). Moderate or severe mitral regurgitation was less common in the combined‐procedure group than in the CABG‐alone group (11.2% vs. 31.0%, p <0.001). There were no significant between‐group differences in major adverse cardiac or cerebrovascular events, deaths, readmissions, functional status, or quality of life at 1 year.
Conclusions: In patients with moderate ischemic mitral regurgitation, the addition of mitral‐valve repair to CABG did not result in a higher degree of left ventricular reverse remodeling. Mitral‐valve repair was associated with a reduced prevalence of moderate or severe mitral regurgitation but an increased number of untoward events. Thus, at 1 year, this trial did not show a clinically meaningful advantage of adding mitral‐valve repair to CABG. Longer‐term follow‐up may determine whether the lower prevalence of mitral regurgitation translates into a net clinical benefit. (Funded by the National Institutes of Health and the Canadian Institutes of Health Research; ClinicalTrials.gov number, NCT00806988.)
ComentárioIntroduçãoA insuficiência mitral isquémica (IMI) é a consequência de alterações da contractilidade e/ou do remodeling do ventrículo esquerdo (VE) após enfarte do miocárdio e a regurgitação é provocada pela deslocação lateral e apical dos músculos papilares que impedem o normal encerramento da válvula, enquanto o aparelho valvular é morfologicamente normal. Sabe‐se que a IMI está associada a um prognóstico desfavorável e que este impacto negativo aparece mesmo quando a IMI é moderada1. Enquanto na IMI severa o debate é sobre se se deve realizar a reparação ou a substituição valvular e foi recentemente alvo de um estudo aleatorizado2, na IMI moderada a questão que se coloca é saber se à cirurgia de revascularização do miocárdio (CABG) se deve ou não associar a plastia da válvula mitral.
Os proponentes da CABG isolada defendem que a revascularização melhora a contractilidade regional, diminui a dilatação do VE, eliminando as forças de retração que se exercem sobre a válvula mitral, permitindo restabelecer a competência da mesma e que a associação de um gesto de reparação mitral aumenta o risco perioperatório3. Os proponentes da associação CABG e intervenção na mitral argumentam que a revascularização isolada não elimina, numa percentagem elevada de casos, a IMI e que a sua correção diminui o risco de remodelagem adversa do VE e de insuficiência cardíaca4.
O artigo do mêsEm dezembro de 2014, Smith et al. publicaram este importante estudo aleatorizado, no The New England Journal of Medicine, que tenta responder a esta controvérsia5. O estudo inclui doentes com doença coronária multivasos e IMI moderada definida por pelo menos dois de três critérios: orifício efetivo regurgitante 0,2‐0,4cm2, vena contracta de 3mm e um rácio da área do jato/área auricular esquerda 20‐40%. Trezentos e um doentes foram aleatorizados para CABG isolada com CEC ou CABG+plastia mitral com anel rígido e downsizing de dois tamanhos do anel relativo às dimensões do folheto anterior.
O endpoint primário foi o volume telessitólico do ventrículo esquerdo indexado (VTSVEI),12 meses após a cirurgia. Os end points secundários foram um índice de eventos adversos composto (morte, AVC, reintervenção mitral, hospitalização por insuficiência cardíaca ou aumento de pelo menos uma classe NYHA), mortalidade, eventos adversos sérios, IM residual, estado funcional e qualidade de vida.
Doze meses após a cirurgia o VTSVEI foi de 46,1±22,4ml/m2 no grupo CABG‐isolada e 49,6±31,5ml/m2 no grupo CABG+plastia mitral (p=0,61). A taxa de mortalidade foi de 7,3 e 6,7% no grupo isolado e combinado, respetivamente. A proporção de doentes com IMI residual (moderada ou severa) foi significativamente maior no grupo CABG isolada do que no grupo CABG‐plastia mitral (31% versus 11%; p=0,001). Dois doentes do grupo combinado versus zero no grupo CABG isolado necessitaram reoperação mitral (p=0,2).
Os tempos de clampagem e de CEC, assim como o tempo de UCI e de internamento, foram superiores no grupo CABG‐plastia mitral. Doze meses após a cirurgia não houve diferença significativa entre os dois grupos na taxa de eventos adversos cumulados nem em nenhum dos seus componentes isolados. No entanto, a taxa de eventos adversos neurológicos (AVC, AIT, encefalopatia metabólica) foi significativamente maior no grupo combinado (p=0,03), assim como a taxa de arritmias supraventriculares (p=0,03). Não se observou nenhuma diferença significativa na qualidade de vida entre os dois grupos.
Que lições podemos tirar deste estudo?Em primeiro lugar, não se observou diferença significativa no end point primário (volume telessistólico VTSVEI), apesar de um grau de IM residual significativamente inferior nos doentes submetidos a CABG e plastia mitral. Também não houve diferenças significativas, tanto nos MACCE, mortalidade, como no estado funcional e qualidade de vida, 12 meses após a cirurgia. No entanto, isto não significa que com um follow‐up mais alargado esta diferença não se venha a materializar.
Em segundo lugar, a proporção de doentes com enfarte do miocárdio prévio foi de cerca de 65% nos dois grupos. Isto significa que, em 35% dos doentes, a IMI era provocada por isquemia reversível e não por remodelling adverso, o que pode explicar porque a CABG isolada permitiu corrigir a disfunção contráctil, o que não aconteceria se a disfunção fosse devida a necrose do miocárdio.
Em terceiro lugar, dois estudos aleatorizados, mais pequenos, mostraram melhores resultados da associação CABG‐plastia mitral comparativamente com CABG isolada, em termos de reverse remodelling e outros surrogate end points. É possível que estas diferenças tenham a ver com o tipo de end points escolhidos, metodologia de quantificação da IMI, tempo entre início da IMI e inclusão e diferenças na proporção de doentes com enfarte prévio6,7.
Em conclusão, tratar um problema ventricular, como é o caso da IMI, moderada ou severa, com uma solução a nível anular mitral, com colocação de um anel restritivo, não parece ser o Santo Graal2,5. No entanto, o debate não está encerrado e este estudo, assim como o que compara plastia versus substituição na IMI severa2, prevêem reportar resultados com follow‐up alargado. Até lá, a decisão quanto a CABG isolada ou com plastia mitral associada, nos doentes com IMI moderada, deve ser baseada numa avaliação multidisciplinar. Os elementos de decisão incluem a análise quantitativa rigorosa da IMI e do seu impacto, a deteção de isquemia reversível e a análise das comorbilidades e esperança e qualidade de vida do doente.
Conflito de interessesO autor declara não haver conflito de interesses.