As anomalias congénitas das artérias coronárias associadas às cardiopatias congénitas condicionam as opções terapêuticas.
O ecocardiograma é o exame de primeira linha para o diagnóstico e acompanhamento dos doentes com cardiopatias congénitas. No entanto, a sua utilidade diminui quando é necessária a avaliação anatómica dos grandes vasos e das artérias coronárias. O cateterismo cardíaco tem um risco acrescido de complicações, inerente à sua natureza invasiva, e, por ser uma técnica de projeção 2D, fornece informação anatómica limitada.
Nas últimas duas décadas a tomografia computorizada (TC) e a ressonância magnética surgiram como importantes ferramentas diagnósticas complementares não invasivas, capazes de fornecer informações anatómicas precisas, não acessíveis por qualquer outra modalidade de diagnóstico atual.
Os autores descrevem os achados em TC de uma criança do sexo masculino com 29 meses, referenciada para angio-TC cardíaca para avaliação de uma cardiopatia congénita complexa. O estudo foi efetuado em equipamento multi-corte de dupla-ampola de 128 cortes (Siemens Definition Flash) com sincronização electrocardiográfica prospetiva, que demonstrou mesocardia com situs inversus abdomino-auricular (Figura 1), discordância aurículo-ventricular e ventrículo-arterial com comunicação interventricular subpulmonar e artéria coronária única (Figura 2). A dose de radiação efetiva foi de 1,0mSv (DLP 25mGy*cm).
Mesocardia e situs inversus. (A) Topograma, (B) reconstrução multiplanar no plano coronal, (C) imagem axial do abdómen e (D) 3D volume rendering mostrando mesocardia, brônquio morfologicamente direito em posição esquerda, brônquio morfologicamente esquerdo em posição direita, fígado à esquerda, estômago e baço à direita e aorta anterior e direita e artéria pulmonar posterior e esquerda.
Ao: artéria aorta; B: baço; E: estômago; F: fígado; P: artéria pulmonar.
Discordância aurículo-ventricular e ventrículo-arterial e artéria coronária única. (A) Imagem axial e (B, C e D) reconstruções multiplanares evidenciando discordância aurículo-ventricular e ventrículo-arterial, com aorta anterior e direita e artéria pulmonar posterior e esquerda, defeito do septo infundibular com comunicação interventricular subarterial (*), bem como origem anómala da artéria coronária direita do seio coronário esquerdo, com trajeto entre a aorta e a artéria pulmonar.
AD: aurícula direita; AE: aurícula esquerda; Ao: artéria aorta; CD: artéria coronária direta; Cx: artéria circunflexa; DA: artéria descendente anterior; P: artéria pulmonar; VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo.
Este doente foi recusado para cirurgia pelo elevado risco cirúrgico conferido pela artéria coronária única. Este caso é ilustrativo do potencial da angio-TC cardíaca na avaliação anatómica detalhada e não invasiva das estruturas intra e extracardíacas e contribuiu de forma decisiva para a decisão terapêutica.