Informação da revista
Vol. 37. Núm. 10.
Páginas 809-810 (outubro 2018)
Partilhar
Partilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Vol. 37. Núm. 10.
Páginas 809-810 (outubro 2018)
Comentário editorial
Open Access
Ainda haverá lugar para novos parâmetros ecocardiográficos na estratificação de risco após enfarte agudo do miocárdio?
Is there still a place for new echocardiographic parameters in risk stratification after acute myocardial infarction?
Visitas
3330
Ana Teresa Timóteoa,b
a Centro Universitário de Cardiologia, Hospital de Santa Marta, Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa, Portugal
b Nova Medical School, Lisboa, Portugal
Conteúdo relacionado
Filipa Cordeiro, Pedro Silva Mateus, Sílvia Leão, Miguel Moz, Joana Trigo, Catarina Ferreira, Sofia Silva Carvalho, Alberto Ferreira, José Ilídio Moreira
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Texto Completo

A função auricular esquerda é fundamental para o enchimento adequado do ventrículo esquerdo e tem uma relação direta com a função diastólica. O volume indexado da aurícula esquerda é um parâmetro muito importante e que hoje faz parte das recomendações para avaliação da função diastólica1. É também reconhecido o seu papel prognóstico em várias patologias cardíacas, como a fibrilhação auricular, a estenose valvular aórtica, as cardiopatias congénitas, a insuficiência cardíaca e diversas outras patologias2–6. Por esse motivo, as dimensões anteroposteriores ou a área da aurícula esquerda por planimetria têm sido recentemente substituídas pelo volume indexado.

No presente número desta revista, Filipa Cordeiro et al. analisaram o impacto prognóstico do volume indexado da aurícula esquerda, uma medição ecocardiográfica muito simples, em doentes com enfarte agudo do miocárdio com elevação do segmento ST7. O estudo incluiu doentes submetidos a angioplastia primária durante um período de cinco anos, tendo sido realizada avaliação do volume da aurícula esquerda pelo método área‐comprimento e indexada à área de superfície corporal. Em 42% dos doentes, verificou‐se aumento do volume auricular e num seguimento mediano de 28 meses ocorreu morte de todas as causas em 7%, eventos compostos cardíacos em 26,5% e eventos compostos cardiovasculares em 29% dos doentes. Nos doentes com dilatação auricular esquerda a frequência dos eventos considerados foi superior, sendo este parâmetro um preditor independente de morte e dos restantes eventos considerados. O trabalho não é original, uma vez que outros trabalhos, com amostras de dimensões sobreponíveis, já tinham sugerido esta associação8,9. Contudo, trata‐se de um trabalho realizado em Portugal, o que valida estes achados para a nossa realidade.

Alguns aspetos merecem, contudo, ser discutidos. Por um lado, os autores utilizaram o método área‐comprimento para calcular o volume auricular esquerdo, que, apesar de ser um dos métodos recomendados para avaliação da aurícula esquerda, assume uma morfologia elipsoide que nem sempre é a morfologia presente. Com efeito, estudos prévios mostram que com o método área‐comprimento se obtêm valores mais elevados comparativamente com o método de discos também recomendado, levando a reclassificações em até 18% dos indivíduos relativamente aos limiares considerados6. Contudo, o aumento do volume auricular esquerdo está associado a pior prognóstico independentemente dos limiares considerados ou dos métodos utilizados para avaliação.

Por outro lado, os autores não ajustaram em análise multivariada para outras variáveis clínicas e laboratoriais com impacto prognóstico nas síndromes coronárias agudas, tais como a função renal, classe Killip, frequência cardíaca, tensão arterial, entre outros, nem para a hipertensão arterial, que é um parâmetro com impacto nas dimensões da aurícula esquerda, pelo que o efeito independente observado no presente estudo poderá ser fortemente reduzido ou anulado se realizado esse ajuste. Um outro ponto não ajustado pelos autores foi o tempo de isquemia. Sabe‐se hoje que para tempos isquémicos mais prolongados se verificam aumentos de volumes da aurícula esquerda, pelo que este parâmetro deveria ter sido considerado na análise estatística10.

Finalmente, uma outra limitação importante e que também foi salientada pelos autores é a dimensão da amostra que, sendo razoável, não é adequada para a análise proposta, bem como o número algo baixo de alguns eventos, tendo obrigado os autores a fazer uma análise com eventos compostos. Este aspeto é particularmente patente nos largos intervalos de confiança apresentados nos resultados para alguns dos eventos considerados e também na ausência de significância estatística na comparação de grupos quando os valores e as percentagens são claramente diferentes.

A utilização de um parâmetro ecocardiográfico muito simples de obter, como o volume auricular esquerdo indexado, parece ser promissora para avaliação prognóstica. A avaliação ecocardiográfica é até mandatória segundo critérios de avaliação de qualidade nas síndromes coronárias agudas, pelo que toda informação com impacto prognóstico que o ecocardiograma nos possa fornecer deverá ser sempre tida em conta. No entanto, é importante colocar algumas questões adicionais: devemos aumentar a complexidade da estratificação de risco com novos parâmetros que têm vindo a ser sucessivamente descritos? Será o valor prognóstico do volume auricular esquerdo superior a outros parâmetros bem estabelecidos isoladamente ou inseridos em scores de risco, como o score GRACE? Quais as verdadeiras implicações clínicas na presença de uma aurícula esquerda dilatada – deverá ser realizada alguma mudança na nossa prática clinica? Estes aspetos carecem de melhor caracterização e para isso será necessário um estudo mais alargado, com adequado poder estatístico.

Conflitos de interesses

O autor declara não haver conflito de interesses.

Bibliografia
[1]
S.F. Nagueh, A.O. Smiseth, C.P. Appleton, et al.
Recommendations for the evaluation of left ventricular diastolic function by echocardiography: an update from the American Society of Echocardiography and the European Association of Cardiovascular Imaging.
Eur Heart J Cardiovasc Imaging, 17 (2016), pp. 1321-1360
[2]
J. Mesquita, A.M. Ferreira, A. Cavaco, et al.
Development and validation of a risk score for predicting atrial fibrillation recurrence after a first catheter ablation procedure – ATLAS score.
Europace, (2017),
[3]
N.L. Christensen, J.S. Dahl, R. Carter-Storch, et al.
Relation of left atrial size, cardiac morphology, and clinical outcome in asymptomatic aortic stenosis.
Am J Cardiol, 120 (2017), pp. 1877-1883
[4]
E. Donal, L.H. Lund, E. Oger, et al.
Importance of combined left atrial size and estimated pulmonary pressure for clinical outcome in patients presenting with heart failure with preserved ejection fraction.
Eur Heart J Cardiovasc Imaging, 18 (2017), pp. 629-635
[5]
V.J.M. Baggen, A.W. Schut, J.A.A.E. Cuypers, et al.
Prognostic value of left atrial size and function in adults with tetralogy of Fallot.
Int J Cardiol, 236 (2017), pp. 125-131
[6]
E. Surkova, L.P. Badano, D. Genovese, et al.
Clinical and prognostic implications of methods and partition values used to assess left atrial volume by two‐dimensional echocardiography.
J Am Soc Echocardiogr, 30 (2017), pp. 1119-1129
[7]
F. Cordeiro, P.S. Mateus, S. Leão, et al.
Left atrial volume index: can it provide additional prognostic information in ST‐segment elevation myocardial infarction treated with primary percutaneous coronary intervention?.
[8]
D. Modin, F.J. Olsen, S. Pedersen, et al.
Measures of left atrial function predict incident atrial fibrillation in STEMI patients treated with primary percutaneous coronary intervention.
Int J Cardiol, 263 (2018), pp. 1-6
[9]
J.A. Secundo Junior, M.A. Santos, C.B. Faro, et al.
Left atrial volume index and prediction of events in acute coronary syndrome: Soler Registry.
Arq Bras Cardiol, 103 (2014), pp. 282-291
[10]
I. Ilic, I. Stankovic, R. Vidakovic, et al.
Relationship of ischemic times and left atrial volume and function in patients with ST‐segment elevation myocardial infarction treated with primary percutaneous coronary intervention.
Int J Cardiovasc Imaging, 31 (2015), pp. 709-716
Copyright © 2018. Sociedade Portuguesa de Cardiologia
Baixar PDF
Idiomas
Revista Portuguesa de Cardiologia
Opções de artigo
Ferramentas
en pt

Are you a health professional able to prescribe or dispense drugs?

Você é um profissional de saúde habilitado a prescrever ou dispensar medicamentos

Ao assinalar que é «Profissional de Saúde», declara conhecer e aceitar que a responsável pelo tratamento dos dados pessoais dos utilizadores da página de internet da Revista Portuguesa de Cardiologia (RPC), é esta entidade, com sede no Campo Grande, n.º 28, 13.º, 1700-093 Lisboa, com os telefones 217 970 685 e 217 817 630, fax 217 931 095 e com o endereço de correio eletrónico revista@spc.pt. Declaro para todos os fins, que assumo inteira responsabilidade pela veracidade e exatidão da afirmação aqui fornecida.