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Vol. 38. Issue 7.
Pages 461-462 (July 2019)
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Vol. 38. Issue 7.
Pages 461-462 (July 2019)
Editorial
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Sessão Solene evocativa do 70.° Aniversário da Sociedade Portuguesa de Cardiologia
Formal sitting to commemorate the 70th anniversary of the Portuguese Society of Cardiology
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Victor Machado Gil
Presidente da SPC
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A destruição da Europa provocada pela guerra e o isolamento político de Portugal nos anos 1940 não conseguiram abafar o pensamento e a vontade de um punhado de pioneiros que sonharam mais longe, que quiseram estar na linha da frente da cultura científica e em 9 de julho de 1949, quatro anos depois do armistício, assinaram a ata que instituiu a Sociedade Portuguesa de Cardiologia. Um ano depois, a Sociedade Portuguesa de Cardiologia é um dos membros fundadores da Sociedade Europeia de Cardiologia e nesse ano uma dezena de trabalhos portugueses são apresentados no primeiro congresso mundial de cardiologia. Esse grupo de 17 médicos, alguns deles antepassados de colegas hoje membros da SPC, teve a audácia de dar o primeiro passo e apontar o caminho partindo de um patamar elevado e com isso elevando também a responsabilidade dos que se seguiram. E tantas foram as personalidades ilustres que fizeram a história da SPC enquanto faziam a história da medicina portuguesa. João Porto, Moniz Bettencourt, Arsénio Cordeiro, Machado Macedo, Cerqueira Gomes, Fernando de Pádua, Carlos Ribeiro, Ricardo Seabra‐Gomes são alguns dos tantos cuja vida e obra hoje veneramos. Setenta anos depois, aqui estamos para lhes prestar homenagem e, fazendo‐o, evocar o percurso desta grande organização que ao longo destas décadas tem servido à comunidade pelo estudo e pela difusão do conhecimento, pela interpretação da ciência, pela promoção das boas práticas, pela divulgação da inovação, com independência, isenção e rigor, no respeito pela ética e pelo melhor interesse das pessoas que servimos. A prática do debate interpares em que cada opinião conta independentemente da graduação, idade ou opção de quem a profere, a democraticidade da nossa prática interna, a atitude inclusiva, multidisciplinar e abrangente, fazem da SPC uma escola de valores mais que apenas de conhecimentos e é no cumprimento do que sentimos como um dever cívico e norteados por esses princípios que temos formado gerações de cardiologistas, de outros médicos e outras profissões na intersecção da ciência cardiovascular.

Esta sessão evoca solenemente o 70.° aniversário da Sociedade Portuguesa de Cardiologia. No conjunto de iniciativas de comemoração desta efeméride, incluímos a criação de uma bolsa de investigação que conta com a parceria do Banco de Portugal. Esta bolsa única, histórica e evocativa estimula a candidatura de projetos que envolvam pelo menos três equipas nacionais, promovendo o esforço colaborativo entre instituições. Pela capacidade de ver longe e pela solidariedade demonstrada, apresentamos ao Banco de Portugal o nosso profundo reconhecimento. Esperamos que esta associação seja emblemática e inspiradora de outras empresas e entidades que, além da indústria farmacêutica e de dispositivos médicos a quem igualmente agradecemos o seu apoio continuado, queiram assegurar no futuro um modelo diferente de suporte da nossa atividade educativa e investigacional. Das comemorações do 70.° aniversário farão parte dois eventos culturais a realizar nos últimos meses deste ano, um concerto executado por músicos da família cardiologista e um ciclo de cinema em associação à Cinemateca Nacional onde serão exibidos filmes que evocam temas relacionados com o coração. Está ainda em preparação uma sessão na cidade do Porto.

Muitas foram as criações da SPC: a edição do Boletim e mais tarde da Revista Portuguesa de Cardiologia, uma das primeiras revistas indexadas do país, o Congresso Português de Cardiologia, nascido no simbólico ano de 1974, porventura o mais avançado congresso científico português, o Centro Nacional de Coleção de Dados em Cardiologia que com Ricardo Seabra‐Gomes e Lino Gonçalves tive a honra de ajudar a construir, a escola de formação hoje designada por Academia Cardiovascular.

Mantemos uma intensa e permanente atividade educacional. Organizámos dezenas de cursos e outras atividades formativas, envolvendo mais de 10 000 participantes. Promovemos até ao presente 12 registos nacionais que envolveram mais de 228 000 doentes e originaram numerosas publicações científicas.

Na base da nossa ação, uma intensa atividade de estudo e reflexão é levada a cabo pelos Grupos de Estudo e pelas Associações Especializadas que na área da Cardiologia de Intervenção e na Arritmologia cresceram e ganharam espaço e autonomia dentro da mesma casa de todos.

Há quarenta anos – e essa é uma efeméride que hoje, fraternalmente, também saudamos – emergiu da SPC a Fundação Portuguesa de Cardiologia, com a especial missão de levar às populações as mensagens adequadas para uma melhor saúde cardiovascular. Evocando esse espírito inicial, assinamos este ano um protocolo de afiliação que permitirá caminharmos melhor cumprindo em conjunto as tarefas que forem comuns. Outras organizações independentes tiveram como ponto de partida a SPC, como a Sociedade Portuguesa de Hipertensão, ou a ela estão ligadas por laços ou práticas. Encontra‐se neste grupo a Sociedade Portuguesa de Aterosclerose e a Sociedade Portuguesa de Cirurgia Cardiotorácica e Vascular. A todas interpelamos para, mantendo a sua identidade própria, se sentirem como «gente de casa».

Como seu membro fundador, comungando do mesmo espírito e missão, ligam‐nos à Sociedade Europeia de Cardiologia os mais fortes laços expressos em inúmeros cargos desempenhados no passado e no presente por cardiologistas portugueses. A relação com a Sociedade Brasileira de Cardiologia, verdadeiramente fraterna não na retórica do discurso, mas nas cumplicidades de práticas conjuntas de que é exemplo grande o programa SAVIC, amplia‐se cada ano abrindo novas frentes de colaboração. Fundadores da Federação das Sociedades Cardiovasculares de Língua Portuguesa, procuramos manter viva na área cardiovascular a ideia pessoana desta grande pátria que é a língua portuguesa.

Na antropologia veterotestamentária, o coração era tido como a sede da inteligência, da vontade e da liberdade. A visão atual, mais prosaica, não desvirtua, todavia, o papel propulsionador do rio circulatório que desde Harvey sabemos ser o grande motor da vida e cujo curso atribulado faz das doenças cardiocirculatórias as principais causas de mortalidade no nosso país, como no mundo mais desenvolvido. Fruto do extraordinário avanço científico da área farmacológica e dos dispositivos médicos, do maior conhecimento sobre o risco cardiovascular e adoção de medidas de combate ativo aos fatores que o determinam, de uma maior literacia em saúde das populações, a redução da mortalidade cardiovascular tem sido progressiva nas últimas décadas e sentimos que contribuímos para isso de forma substantiva. Manter o já conseguido no enfarte, identificar pontos de melhoria e lutar por eles, abrir novas frentes como a morte súbita e a insuficiência cardíaca, implicam prosseguir uma atitude atenta e empenhada.

Honrados por um passado ilustre, queremos ser atores do presente e arautos do futuro. Estamos conscientes das polémicas e dos desafios, temos pensamento, opinião e voz. Acompanhamos o debate sobre os modelos do sistema de saúde em Portugal e o acesso dos portugueses aos melhores cuidados. Impele‐nos a inovação, mas no mesmo plano o seu equilíbrio com a sustentabilidade do sistema. Preocupa‐nos a futilidade e a redundância. Estamos atentos aos desafios e inquietações do futuro, o papel da máquina como auxiliar da praxis médica, ou ao invés seu substituto, com a correspondente reflexão sobre a sua capacidade de aprender, decidir e ser responsabilizada. Estamos abertos aos novos paradigmas de pensamento científico, aos futuros modelos de exercício da medicina cardiovascular e a decorrente evolução dos programas formativos, à necessária atualização permanente de forma a garantir uma qualidade de desempenho adequado.

Senhor Presidente da República, a presença de Vossa Excelência honra‐nos e responsabiliza‐nos.

O que nos move, por objetivo e missão, é contribuir para a melhoria da saúde cardiovascular dos portugueses. Somos especialmente tocados pelo sofrimento, a fragilidade, a exclusão. Não exercemos a política, mas apontamos rumos suportados na melhor ciência. E esses rumos poderão ajudar os decisores a tomar as melhores opções; contarão sempre com a nossa disponibilidade séria, desinteressada e rigorosa.

Agora que entramos na idade da sabedoria, continuaremos este exercício diário de cidadania que é trabalhar pelo engrandecimento da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.

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