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Vol. 30. Issue 10.
Pages 809-811 (October 2011)
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Pages 809-811 (October 2011)
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Comment on “Defining left bundle branch block in the era of cardiac resynchronization therapy”
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Mário Oliveira
Member of the Editorial Board of the Revista Portuguesa de Cardiologia
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Abstract

Cardiac resynchronization therapy (CRT) has emerged as an attractive intervention to improve left ventricular mechanical function by changing the sequence of electrical activation.

Unfortunately, many patients receiving CRT do not benefit but are subjected to device complications and costs. Thus, there is a need for better selection criteria. Current criteria for CRT eligibility include a QRS duration >120ms. However, QRS morphology is not considered, although it can indicate the cause of delayed conduction. Recent studies have suggested that only patients with left bundle branch block (LBBB) benefit from CRT, and not patients with right bundle branch block or nonspecific intraventricular conduction delay. The authors review the pathophysiologic and clinical evidence supporting why only patients with complete LBBB benefit from CRT. Furthermore, they review how the threshold of 120ms to define LBBB was derived subjectively at a time when criteria for LBBB and right bundle branch block were mistakenly reversed. Three key studies over the past 65 years have suggested that 1/3 of patients diagnosed with LBBB by conventional electrocardiographic criteria may not have true complete LBBB, but likely have a combination of left ventricular hypertrophy and left anterior fascicular block. On the basis of additional insights from computer simulations, the investigators propose stricter criteria for complete LBBB that include a QRS duration >140ms for men and >130ms for women, along with mid-QRS notching or slurring in >2 contiguous leads. Further studies are needed to reinvestigate the electrocardiographic criteria for complete LBBB and the implications of these criteria for selecting patients for CRT.

Keywords:
Left bundle branch block
Cardiac resynchronization therapy
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Comentário

A insuficiência cardíaca crónica (ICC) representa um problema crescente de saúde pública que afecta milhões de pessoas em todo o mundo, associando-se não só a custos muito significativos para os diferentes sistemas, relacionados com limitações no desempenho da actividade profissional, hospitalizações e utilização dos recursos clínicos, mas também a elevada mortalidade e compromisso da qualidade de vida1. Cerca de 30% dos doentes com ICC e função sistólica diminuída apresentam anomalias do sistema de condução cardíaco, que resultam em complexos QRS com duração > 120ms, frequentemente com padrão de bloqueio completo do ramo esquerdo do feixe de His (BCRE), condicionando dessincronia na activação ventricular, que se traduz por um relevante impacto hemodinâmico e clínico2. A presença de BCRE no âmbito da ICC com disfunção sistólica ventricular esquerda é aceite como um marcador independente de mortalidade cardiovascular3. Neste contexto, a terapêutica de ressincronização cardíaca (TRC) tem demonstrado melhorar a sintomatologia, a qualidade de vida e tolerância ao exercício, reduzindo as hospitalizações por ICC e a mortalidade (em doentes com ICC, disfunção sistólica grave do ventrículo esquerdo e QRS ≥ 120-150ms, sob terapêutica médica optimizada)4,5. No entanto, apesar da evidência dos benefícios da TRC, permanece por resolver a problemática da ausência de resposta favorável em aproximadamente 30% dos doentes non-responders6. Neste cenário, uma análise crítica da selecção dos doentes para TRC com base na morfologia do QRS, nomeadamente dos critérios para uma correcta definição de BCRE, pode ter implicações clínicas relevantes no estabelecimento das indicações para TRC.

No presente artigo, os autores abordam uma questão emergente que diz respeito ao facto de que doentes sem BCRE podem não beneficiar da TRC, e discutem a evidência de que 1/3 dos doentes com diagnóstico de BCRE, com base na definição actual, na realidade têm uma combinação de hipertrofia ventricular esquerda com hemibloqueio esquerdo anterior7. Nesse sentido, sugerem uma redefinição dos critérios para diagnóstico de BCRE, que incluem a duração mínima do QRS de 140ms nos homens e de 130ms nas mulheres, um padrão QS ou rS na derivação V1 e a presença de entalhe ou empastamento no meio do QRS, e apontam para a necessidade da validação destes critérios na identificação dos candidatos a TRC.

Terapêutica de ressíncronização cardíaca

Na presença de BCRE a condução ventricular inicia-se no ventrículo direito, propagando-se depois pelo septo interventricular (durante 40-50ms) até atingir o endocárdio ventricular esquerdo. Depois, requer mais 50ms para percorrer a rede de Purkinge até ao endocárdio da parede póstero-lateral, e 50ms para despolarizar esta parede, perfazendo 140 a 150 ms8. O objectivo da TRC é o de corrigir o atraso entre a activação do septo interventricular e a parede livre do ventrículo esquerdo através da estimulação eléctrica simultânea destes segmentos e respectiva ressíncronização mecânica.

As actuais recomendações para implantação de TRC baseiam-se na duração do QRS ≥120ms, sem especificar a respectiva morfologia9. No entanto, no mesmo documento, é referido que o padrão típico de BCRE se associa a uma resposta mais favorável, enquanto o bloqueio completo do ramo direito é considerado um marcador predizente de ausência de resposta terapêutica. Na verdade, nos estudos COMPANION e MADIT-CRT os doentes sem BCRE ou com QRS ≤ 147ms e < 150ms, respectivamente, não obtiveram benefício significativo da TRC10,11. Mais recentemente, um relatório da MEDICARE, envolvendo cerca de 15 000 doentes, mostrou que os casos com TRC sem BCRE apresentam maior mortalidade, e que os que têm uma duração basal do QRS ≥ 150ms na presença de BCRE são os que evidenciam melhor prognóstico12.

Proposta para (re)definição de Bloqueio Completo do Ramo Esquerdo

A definição mais detalhada de BCRE, proposta por Wilson em 1941, centra-se, entre outros, no critério de duração de QRS ≥ 120ms, que resultou da comparação do padrão obtido em estudos experimentais em cães com electrocardiogramas de humanos, numa altura em que o conceito de hemibloqueio esquerdo anterior não tinha sido descrito como tal e em que a literatura não contemplava o alargamento do QRS como podendo resultar de hipertrofia ventricular esquerda.

A questão de que o uso de critérios clássicos pode levar a um diagnóstico incorrecto de BCRE não é nova. Em 1956, Grant e Dole mostraram que o prolongamento do QRS causado pelo BCRE é ≥ 60ms e que os vectores da despolarização ventricular inicial mudam devido à diferente activação do septo interventricular13. Neste sentido, o aumento que ocorre de modo progressivo na duração do QRS, sem modificação do padrão morfológico, nomeadamente do início do QRS, não é consistente com o diagnóstico de BCRE. Nos últimos anos, diferentes autores, recorrendo a mapeamento electrofisiológico convencional e tridimensional, sugeriram que 1/3 dos doentes classificados com tendo BCRE apresentam antes diferentes formas de perturbação da condução interventricular, em particular a combinação de hemibloqueio esquerdo anterior comhipertrofia ventricular esquerda13–15. Assim, para além da recente sugestão incluída nas guidelines da American Heart Association, American College of Cardiology e Heart Rhythm Society para interpretação do eletrocardiograma, recomendando que se associe à duração do QRS ≥ 120ms, QS ou rS em V1 e V2 e onda R monofásica em V6 a presença de entalhe ou empastamento da onda R nas derivações DI, aVL, V5 ou V616, os autores do presente artigo propõem que a duração do QRS no BCRE seja ≥ 140ms nos homens e ≥ 130ms nas mulheres. As diferenças entre sexos são justificadas pelo facto dos homens terem maior superfície corporal e massa ventricular (com mais tempo de despolarização), com uma duração média do QRS significativamente superior à das mulheres. Este aspecto da análise do ECG pode estar na base do maior benefício registado no sexo feminino, bem como no subgrupo com QRS inicial ≥ 150ms, no estudo MADIT-CRT, em que os critérios de selecção consistiram na presença de ICC (classe I-II da NYHA), ritmo sinusal, fracção de ejecção ≤ 30% e duração do QRS ≥ 130 ms17.

A importância da melhor selecção dos candidatos a TRC deve ter em consideração as limitações actuais que dependem de conceitos electrocardiográficos, nem sempre aplicados de forma adequada, permanecendo em debate a definição mais correcta de BCRE e a importância dos métodos de imagem na identificação da presença de dessíncronia mecânica, nomeadamente nos doentes com perturbação da condução inraventricular sem critérios de BCRE. No momento actual, é justificável a realização de estudos que possam validar a aplicação de critérios electrocardiográficos como os aqui sugeridos na melhor identificação dos doentes que possam obter benefício da TRC.

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