This paper provides an update for 2014 on the burden of cardiovascular disease (CVD), and in particular coronary heart disease (CHD) and stroke, across the countries of Europe. Cardiovascular disease causes more deaths among Europeans than any other condition, and in many countries still causes more than twice as many deaths as cancer. There is clear evidence in most countries with available data that mortality and case-fatality rates from CHD and stroke have decreased substantially over the last 5-10 years but at differing rates. The differing recent trends have therefore led to increasing inequalities in the burden of CVD between countries. For some Eastern European countries, including Russia and Ukraine, the mortality rate for CHD for 55-60 year olds is greater than the equivalent rate in France for people 20 years older.
ComentárioA carga de uma doença (Burden of disease) é uma medida que é utilizada para avaliar e comparar o impacte relativo de diferentes doenças na população1. Tal medida permite, igualmente, comparar a magnitude de impacte entre diferentes doenças, populações, regiões geográficas (dentro de um mesmo país, entre países ou regiões do globo) ao longo do tempo ou em diferentes períodos de tempo.
A carga de uma doença pode ser apresentada de acordo com diferentes indicadores ou medidas. Desde logo se destacam as componentes do peso epidemiológico traduzido, principalmente, por taxas de incidência, de prevalência ou por taxas de mortalidade, de mortalidade prematura e de morbilidade; o peso económico refletido, por exemplo, em análises do custo de doença; ou por indicadores compostos, cujo exemplo mais conhecido e amplamente utilizado é o disability-adjusted life years (DALY). O DALY é um indicador de carga de doença, expresso pelo número de anos de vida perdidos por morte prematura (years of life lost – YLL) ou incapacidade (years lived with disability – YLD). Simplificando, pode-se dizer que um DALY é igual a um ano de vida saudável perdido2.
Este tipo de avaliação e comparação (por exemplo, carga de doença e o seu impacte em diferentes países ou períodos de tempo) pode ser utlizado para: i) apoiar os decisores políticos na definição de estratégias e de políticas de saúde; ii) para alinhar a «oferta» (recursos, capacidade instalada) com a procura (necessidades de saúde) melhorando o planeamento de ações de saúde e a afetação de recursos; iii) para monitorizar padrões de saúde/doença nas populações; iv) para medir ganhos em saúde resultante da aplicação de medidas de promoção da saúde ou prevenção da doença; v) para fundamentar e sustentar, de uma forma racional e baseada na evidência, tomadas de decisão a nível político ou de investigação.
Por tudo isto, é plausível afirmar que este tipo de avaliação e de comparação deve ser feita, prioritariamente, em doenças que apresentem maior relevância quer em termos epidemiológicos quer pelos custos que lhe estão associados – como são exemplo as doenças cardiovasculares (DCV) em geral e a doença coronária e a cerebrovascular, em particular. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o número anual de mortes por DCV aumentará de 17 milhões em 2004 para 25 milhões em 2030 3.
Várias são as entidades internacionais que se têm dedicado à realização deste tipo de análises, onde se destacam a OMS, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e o Banco Mundial. Tais análises permitem a comparação entre diferentes países e regiões de forma longitudinal, sendo importantes para aferir iniquidades, avaliar o impacte de determinadas opções em termos de políticas e de investimentos em saúde e relacionar o desenvolvimento económico com padrões de saúde, etc...
O artigo em apreciação apresenta uma atualização dos resultados da carga das DCV, em particular da doença coronária e do acidente vascular cerebral, nos 53 países que integram a região europeia da OMS.
Do ponto de vista metodológico, trata-se de uma análise que parte de várias fontes multinacionais e que utiliza maioritariamente informação de tipo administrativo. Os autores selecionaram essas fontes (WHO mortality database; WHO European Region Health for All Database; e os dados de estatísticas de saúde da OCDE) tendo em consideração a qualidade da informação contida nas mesmas; o facto de terem informação referente a um enorme número de países (que se pretendia analisar) e a atualidade dessa informação.
Dos resultados deste estudo importa destacar o seguinte:
- i)
que as DCV continuam a ser a principal causa de morte na Europa (cerca de quatro milhões de mortes por ano, o que representa cerca de metade do total de mortes), não obstante a tendência decrescente que se tem verificado recentemente em alguns países;
- ii)
a doença coronária é responsável por cerca de 1,8 milhões de mortes (20%) por ano na Europa;
- iii)
total de mortes atribuídas a DCV, não estratificada para a idade, é superior nas mulheres (51%) em relação aos homens (42%);
- iv)
a diferença do total de mortes entre o género masculino e o feminino é significativa e deve-se, em grande medida, à maior percentagem de indivíduos do sexo feminino que morreu por acidente vascular cerebral (14 versus 10% nos homens) e por outras doenças cardíacas (16 versus 12% nos homens);
- v)
a mortalidade associada a DCV aumenta com a idade e, por essa razão, a proporção de mortes prematuras nos países europeus é menor que a taxa global de mortalidade;
- vi)
três em cada dez mortes em indivíduos com idade inferior a 65 anos foram devidas a DCV;
- vii)
cerca de 1,4 milhões de mortes em indivíduos com idade inferior a 75 anos foram devido a DCV e, destes, mais de metade ocorreu no subgrupo de 65-74 anos;
- viii)
os resultados deste estudo demonstram iniquidades ao nível geográfico entre os diferentes países europeus. Portugal, junto com França, Holanda, Espanha, Dinamarca e Noruega, apresenta valores inferiores a 180 mortes associadas a DCV por 100 000 habitantes. No outro extremo países como a Letónia, Lituânia e Bulgária (Europa de leste) esse número é superior a 650/100 000;
- ix)
a mortalidade associada a DCV mostra uma tendência decrescente na maioria dos países europeus, sendo que a amplitude dessa variação, na última década, diferiu substancialmente entre os países.
Este tipo de análises internacionais, que têm por base informação de tipo administrativa contida em bases de dados multinacionais, é bastante útil para realizar comparações a nível macro e, em certa medida, relacionar os ganhos obtidos com as políticas e estratégias definidas por cada país ou grupos de países4.
Em relação a Portugal, de acordo com os resultados deste estudo é visível a obtenção de ganhos significativos ao nível da mortalidade associada às DCV em geral e, em particular, à doença coronária e cerebrovascular. Tal facto terá, seguramente, várias explicações às quais não será alheio o impacte de várias medidas – ao nível da saúde pública – que têm sido implementadas, nomeadamente, a existência de um programa nacional prioritário para as DCV; várias iniciativas ao nível da promoção da saúde e de estilos de vida saudáveis que têm sido desenvolvidas; alargamento e melhoria dos cuidados prestados (veja-se a título de exemplo o aumento do número de ICP primárias, superior a 300 casos por milhão de habitantes/ano, o que coloca Portugal acima da média europeia); evolução do conhecimento biomédico, farmacológico e ao nível das técnicas de diagnóstico e terapêutica, entre outras.
Nunca é demais realçar o contributo deste tipo de análise que, a par com os resultados de estudos epidemiológicos e clínicos, constitui um corpo de evidência extremamente importante no apoio à tomada de decisão dos vários atores da saúde, tendo igualmente um papel fundamental, na definição de políticas, no planeamento, no estabelecimento de prioridades e na afetação de recursos em saúde.
Seria desejável que se continuasse a percorrer este «caminho de sucesso» rumo à melhoria contínua e à obtenção do máximo de ganhos em saúde, na área das DCV, tendo em conta o impacte clínico, económico e social que este grupo de doenças representa em Portugal.