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Vol. 33. Núm. 11.
Páginas 685-690 (novembro 2014)
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Vol. 33. Núm. 11.
Páginas 685-690 (novembro 2014)
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Características clínicas, angiográficas e evolução intra‐hospitalar em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico e síndrome coronária aguda
Clinical characteristics and in‐hospital outcome of patients with acute coronary syndromes and systemic lupus erythematosus
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Alexandre de Matos Soeiro
Autor para correspondência
alexandre.soeiro@bol.com.br

Autor para correspondência.
, Maria Carolina Feres de Almeida Soeiro, Mucio Tavares de Oliveira Jr, Carlos Viente Serrano Jr
Unidade Clínica de Emergência do Instituto do Coração (InCor), Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil
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Estatísticas
Tabelas (4)
Tabela 1. Características basais dos pacientes com LES e SCA
Tabela 2. Características clínicas e eletrocardiográficas dos pacientes com LES e SCA
Tabela 3. Características angiográficas dos pacientes com LES e SCA
Tabela 4. Tratamento e evolução intra‐hospitalar dos pacientes com LES e SCA
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Resumo
Introdução

Devido ao caráter inflamatório crônico do lupus eritematoso sistêmico (LES), os pacientes apresentam reconhecidamente o desenvolvimento de aterosclerose precoce, sendo a própria doença um fator de risco independente para a ocorrência de infarto agudo do miocárdio. Em síndromes coronárias agudas (SCA) a melhor forma de tratamento intervencionista mantém‐se indefinido. Dessa forma, descrevemos as características basais, manifestações clínicas, achados angiográficos, tratamento definitivo adotado e a evolução intra‐hospitalar de pacientes com LES que apresentaram SCA.

Métodos

Entre 2004‐2011 foram analisados retrospectivamente 11 pacientes com LES que apresentaram SCA. As seguintes informações foram obtidas: idade, sexo, manifestações clínicas e eletrocardiográficas, estado hemodinâmico, fatores de risco para SCA, marcadores de necrose miocárdica, clearance de creatinina, fração de ejeção de ventrículo esquerdo, marcadores inflamatórios, autoanticorpos, medicações utilizadas, achados angiográficos, tratamento definitivo adotado e evolução intra‐hospitalar.

Resultados

Dez (91%) pacientes eram mulheres. A mediana de idade foi 47 anos. Dor precordial típica esteve presente em 91%. Cerca de 73% apresentaram aumento de velocidade de hemossedimentação. O seguimento mais acometido foi a artéria descendente anterior em 73%. Em um caso optou‐se por revascularização cirúrgica, em sete pacientes realizou‐se angioplastia com stent convencional e em três doentes manteve‐se tratamento clínico. Obteve‐se mortalidade intra‐hospitalar de 18%.

Conclusão

Apesar da casuística limitada, os dados encontrados são semelhantes ao restante da literatura, ressaltando a precocidade da doença coronária, a presença de aterosclerose como desencadeante principal e a amplitude de sua gravidade com elevada taxa de mortalidade intra‐hospitalar.

Palavras‐chave:
Lúpus eritematoso sistêmico
Síndrome coronária aguda
Inflamação
Abstract
Objective

Due to the chronic inflammation associated with systemic lupus erythematosus (SLE), patients develop premature atherosclerosis and the disease is a risk factor for acute myocardial infarction. The best interventional treatment for acute coronary syndrome (ACS) in these patients is unclear. The objective of this study is to describe the baseline characteristics, clinical manifestations, treatment and in‐hospital outcome of patients with SLE and ACS.

Methods

Eleven SLE patients with ACS were analyzed retrospectively between 2004 and 2011. The following data were obtained: age, gender, clinical and electrocardiographic characteristics, Killip class, risk factors for ACS, myocardial necrosis markers (CK‐MB and troponin), creatinine clearance, left ventricular ejection fraction, inflammatory markers (C‐reactive protein and erythrocyte sedimentation rate), drugs used during hospital stay, treatment (medical, percutaneous or surgical) and in‐hospital outcome. The statistical analysis is presented in percentages and absolute values.

Results

Ten of the patients (91%) were women. The median age was 47 years. Typical precordial pain was present in 91%. Around 73% had positive erythrocyte sedimentation rate. The vessel most often affected was the anterior descending artery, in 73%. One patient underwent coronary artery bypass grafting, seven underwent percutaneous coronary intervention with bare‐metal stents and three were treated medically. In‐hospital mortality was 18%.

Conclusions

Despite the small number of patients, our findings were similar to those in the literature, showing coronary artery disease in young people with SLE due to premature atherosclerosis and a high mortality rate.

Keywords:
Systemic lupus erythematosus
Acute coronary syndromes
Inflammation
Texto Completo
Introdução

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune de ocorrência incomum e ainda de causa desconhecida. Sua prevalência é estimada em um caso para cada 2000 pessoas, sendo 1:10 a relação entre os sexos masculino e feminino, respectivamente. Entre as manifestações da doença, o acometimento cardiovascular é um dos mais frequentes e mais graves, seja sob a forma de miocardite, pericardite, endocardite, vasculites ou doença arterial coronária1.

Devido ao caráter inflamatório crônico do LES, os pacientes apresentam reconhecidamente o desenvolvimento de aterosclerose precoce, sendo a própria doença um fator de risco independente para a ocorrência de infarto agudo do miocárdio (IAM)1–3. Nesse cenário, o melhor esquema terapêutico ainda é um desafio. Em casos de síndromes coronárias agudas (SCA) a melhor forma de tratamento intervencionista mantém‐se indefinida. Algumas séries de casos apresentam a sua experiência com angioplastia coronária (ATC) e/ou cirurgia de revascularização miocárdica (CRM), porém com pouca consistência3,4.

Dessa forma, descrevemos as características basais, manifestações clínicas, tratamento definitivo adotado e a evolução intra‐hospitalar de pacientes com LES que apresentaram SCA.

Métodos

Entre os anos de 2004‐2011 foram analisados retrospectivamente 11 pacientes com LES que apresentaram SCA (angina instável e/ou IAM). O diagnóstico de LES foi realizado com base nos critérios do American College of Rheumatology revisados em 19975.

Todos os pacientes com dor torácica típica foram imediatamente categorizados como SCA e estratificados de acordo com o risco de sua apresentação clínica. Aqueles com dor atípica e/ou sintomas de equivalente isquêmico (como dispneia) foram submetidos a um protocolo de dor torácica permanecendo em observação por 12 horas e realizando eletrocardiograma e marcadores de necrose miocárdica (troponina e CKMB) de 3 em 3 horas. Caso apresentassem alteração de eletrocardiograma como infradesnível de ST ou inversão de onda T e/ou positivassem os marcadores de necrose, seria dado o diagnóstico de SCA e, portanto, seriam incluídos no estudo.

Foram obtidas as seguintes informações: idade, sexo, manifestações clínicas e eletrocardiográficas, estado hemodinâmico (Killip), fatores de risco para SCA, marcadores de necrose miocárdica (CKMB e troponina), clearance de creatinina, fração de ejeção de ventrículo esquerdo, marcadores inflamatórios (proteína‐C reativa e velocidade de hemossedimentação), autoanticorpos, medicações utilizadas no internamento, achados angiográficos, tratamento definitivo adotado (clínico, ATC e/ou CRM) e evolução intra‐hospitalar.

As lesões coronarianas foram consideradas significativas quando correspondiam a no mínimo 70% do diâmetro luminal do vaso.

Quando realizado o tratamento por ATC foram descritos os tipos de stent empregados (convencional ou farmacológico). Em relação às CRM realizadas, foram relatados todos os enxertos arteriais e/ou venosos utilizados.

A análise estatística foi apresentada sob a forma descritiva com percentagens e valores absolutos.

Resultados

Dez pacientes eram mulheres (91%). A mediana de idade foi de 47 anos. As características basais dos pacientes estão descritas na Tabela 1. A apresentação clínica predominante foi o IAM em 64% dos casos, com eletrocardiograma apresentando supradesnível de ST em 45% das vezes, conforme descrito na Tabela 2.

Tabela 1.

Características basais dos pacientes com LES e SCA

Características basais  (%) 
Tempo de internação (média‐dias)  6,7 (1‐15) 
Idade (mediana‐anos)  47 (27‐53) 
Sexo feminino  10 (91) 
Fatores de risco
Hipertensão arterial sistêmica  6 (55) 
Dislipidemia  4 (36) 
Diabetes mellitus  2 (18) 
Tabagismo  4 (36) 
Antecedentes
FEVE (média)  51,1 (16‐80) 
IAM/DAC prévios  2 (18) 
CRM prévia 
Angina estável (CCS)
CCS I 
CCS II  3 (27) 
CCS III 
CCS IV 
Insuficiência cardíaca (NYHA)
CF I 
CF II 
CF III 
CF IV 
Exames laboratoriais (média)
Clearance de creatinina (ml/mín/1,73m353,75 (14‐>60) 
Hemoglobina (g/dL)  12,7 (9,0‐17,4) 
Leucócitos (/mm36.986 (4.300‐10.500) 
Plaquetas (/mm3241.636 (21.000‐412.000) 
LDL‐colesterol (mg/dL)  101 (51‐203) 
HDL‐colesterol (mg/dL)  42 (26‐78) 
Triglicérides (mg/dL)  115 (63‐213) 
Proteína‐C reativa (mg/L)  20,5 (2‐115) 
VHS  17 (6‐29) 
Presença de autoanticorpos
FAN  11 (100) 
Fator reumatoide 
Anticardiolipina  2 (18) 
Anticoagulante lúpico  2 (18) 
Anti‐DNA  3 (27) 
Anti‐RNP  1 (9) 
Anti‐SM 
Anti‐Ro  1 (9) 
Anti‐La  1 (9) 
C3 (média)  12,4 (2‐28) 
C4 (média)  77,1 (26‐155) 
ANCA  2 (18) 

CF: classe funcional; CCS: Canadian Cardiovascular Society; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica; DAC: doença arterial coronária; FAN: fator antinúcleo; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; IAM: infarto agudo do miocárdio; NYHA: New York Heart Association; VHS: velocidade de hemossedimentação.

Tabela 2.

Características clínicas e eletrocardiográficas dos pacientes com LES e SCA

Características clínicas e eletrocardiográficas  (%) 
Quadro clínico
Dor típica  10 (91) 
Dor atípica  1 (9) 
Ausência de dor 
Dispneia  2 (18) 
Eletrocardiograma
Supradesnível de ST  5 (45) 
Infradesnível de ST  1 (9) 
Inversão de onda T  2 (18) 
Sem alterações  3 (27) 
Classificação da SCA
IAM com supradesnível de ST  5 (45) 
IAM sem supradesnível de ST  2 (18) 
Angina instável  4 (36) 
Classificação hemodinâmica ‐ Killip
I  9 (82) 
II 
III 
IV  2 (18) 
Arritmias
FA/flutter atrial 
TVNS 
TV sustentada 
FV/TV sem pulso 
Medicações utilizadas (primeiras 48 horas)
β‐Bloqueador  6 (55) 
Nitrato  5 (45) 
IECA  7 (64) 
ARA II 
Espironolactona  1 (9) 
Furosemida  1 (9) 
AAS  10 (91) 
Clopidogrel  6 (55) 
IGP IIbIIIa  2 (18) 
HNF  1 (9) 
Enoxaparina  8 (73) 
Estatina  8 (73) 
Mofetila 
MTX  1 (9) 
Corticoide  6 (55) 
Azatioprina  3 (27) 

FA: fibrilação atrial; FV: fibrilação ventricular; IAM: infarto agudo do miocárdio; SCA: síndrome coronária aguda; TV=taquicardia ventricular; TVNS: taquicardia ventricular não sustentada.

Os seguimentos arteriais mais acometidos foram a artéria descendente anterior em 73% das vezes e artéria coronária direita em 45% dos casos, seguidos por artéria diagnonal em 36% dos pacientes. Somente em um (9%) caso de SCA não foi encontrada lesão obstrutiva coronária. A lesão ostial foi observada em 9% dos pacientes. Do total, três (27%) casos eram triarteriais e três (27%) biarteriais (Tabela 3).

Tabela 3.

Características angiográficas dos pacientes com LES e SCA

Achados angiográficos coronarianos  (%) 
Artéria acometida
Tronco de coronária esquerda 
Descendente anterior  8 (73) 
Coronária direta  5 (45) 
Circunflexa  2 (18) 
Diagonal  4 (36) 
Marginal esquerda  3 (27) 
Descendente posterior  3 (27) 
Sem lesões  1 (9) 
Padrão arterial
Triarterial  3 (27) 
Biarterial  3 (27) 
Uniarterial  4 (36) 
Lesões ostiais  1 (9) 

ARA II=inibidor da angiotensina II; IECA: inibidor da enzima conversora de angiotensina;; HNF=heparina não fracionada; IGP: inibidor da glicoproteína; MTX: metotrexate.

Em um caso optou‐se pela CRM, em sete pacientes realizou‐se uma ATC com stent convencional e em três doentes manteve‐se o tratamento clínico. Registrou‐se mortalidade intra‐hospitalar de 18% (Tabela 4).

Tabela 4.

Tratamento e evolução intra‐hospitalar dos pacientes com LES e SCA

Tratamento e evolução intra‐hospitalar  (%) 
Evolução geral
AVC na internação 
Sangramento  1 (9) 
Mortalidade intra‐hospitalar  2 (18) 
Pacientes submetidos à CRM
Número de casos  1 (9) 
Enxertos utilizados
Mámaria e in situ 
Veia safena 
Evolução
AVC na internação 
Sangramento 
Mortalidade intra‐hospitalar 
Pacientes submetidos à ATC – stent convencional
Número de casos  7 (64) 
Evolução
AVC na internação 
Sangramento  1 (14) 
Mortalidade intra‐hospitalar  2 (29) 
Pacientes submetidos a tratamento clínico
Número de casos  3 (27) 
Evolução
AVC na internação 
Sangramento 
Mortalidade intra‐hospitalar 

ATC: angioplastia coronária; AVC: acidente vascular cerebral; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica; E: esquerda.

Discussão

O acometimento cardiovascular relacionado ao LES tem sido uma das principais causas de morbimortalidade nesses pacientes. As primeiras descrições dessa associação foram relatadas na década de 19601,6. A incidência de IAM relacionado à aterosclerose precoce em jovens com LES chega a ser nove a 50 vezes maior do que em pacientes sem a doença e de mesma idade, tornando o LES um fator de risco independente para a ocorrência de doença arterial coronária1–3,7. Especificamente em mulheres jovens, o risco é ainda maior devido ao desconhecimento médico do assunto e à pouca relevância dada a esses pacientes, considerados de baixo risco cardiovascular, frente aos sintomas apresentados1,7.

Estudo publicado por Hak et al.8 avaliou a incidência de eventos cardiovasculares através de uma coorte retrospectiva de 148 mulheres com LES por um período de 28 anos. Desse grupo, 13,5% apresentaram algum evento durante o seguimento, com idade média de 53 anos. A incidência de IAM foi cerca de três vezes o relatado para o restante da população sem LES, atribuindo‐se um risco relativo de 2,25 (1,37‐3,69, IC 95%) para a ocorrência do mesmo8. Na casuística apresentada em nosso estudo, há predominância de mulheres (91%) com idade mediana de 47 anos conforme relatado na literatura, sendo que a paciente mais jovem apresentava apenas 27 anos e foi uma das que evoluiu a óbito na internação, salientando a necessidade de diagnóstico e tratamento precoce.

Entre pacientes jovens com LES e com menos de 35 anos, o IAM tem sido relatado como a principal forma de manifestação de doença cardiovascular, seguido de insuficiência cardíaca, morte súbita e angina1,7. Estudos de autópsias de pacientes em LES mostraram que 54% dos pacientes possuíam aterosclerose significativa. O diagnóstico de doença coronária através de testes de isquemia em pacientes com LES é limitado devido à idade e predominância de sexo feminino3,4. No entanto, quando pacientes assintomáticos com LES são submetidos à cintilografia de perfusão miocárdica, cerca de 35‐40% possuem déficits de perfusão miocárdica1,3. Estudos realizados com angiotomografia coronária têm mostrado maior incidência de placas não calcificadas em relação ao grupo controle9. Além disso, a reserva de fluxo coronário também vem mostrando‐se reduzida em pacientes com LES mesmo quando não existe lesão coronária significativa, ressaltando a presença de inflamação permanente nesses pacientes2. Referente à manifestação clínica da doença coronária, encontramos dados semelhantes ao mostrado na literatura. IAM foi a manifestação de SCA em 64% dos pacientes, sendo que 45% do total apresentaram supradesnível de ST e 91% dos pacientes tiveram dor torácica típica relatada.

A fisiopatologia do acometimento coronário no LES ainda é incerta. Além de fatores de risco tradicionais, atribui‐se que a principal causa seja realmente a aterosclerose precoce proveniente da inflamação crônica com lesão endotelial relacionada à própria doença e do uso crônico de medicamentos como corticosteroides3,10. No entanto, o paciente com LES também pode apresentar SCA devido seu maior risco de trombose vascular, principalmente quando o LES estiver associado à síndrome do anticorpo antifosfolípide (a presença de anticorpo antifosfolípide positivo está associado a um risco quatro vezes de IAM e morte súbita)1,10–12. Em pacientes com LES, a presença de fatores de risco tradicionais para aterosclerose deve ser ativamente pesquisada e tratada agressivamente. Hipertensão arterial sistêmica está presente em até 75% dos pacientes com LES e aumenta consideravelmente o risco de eventos cardiovasculares. Além disso, tabagismo pode aumentar o risco de IAM em três vezes em pacientes com LES, além de supostamente reduzir a ação de medicamentos antimaláricos. Por último, no paciente com LES, o perfil lipídico tende a ser modificado em 40% das vezes, com índices elevados de colesterol total e triglicérides. De forma controversa, não existe correlação entre LES e diabetes mellitus, com associação presente em apenas 1,9% dos pacientes1,10. Na nossa população, encontramos dados coincidentes com a literatura em relação à prevalência de hipertensão arterial e dislipidemias, presentes em 55 e 36%, respectivamente. No entanto, diferente do exposto anteriormente, 18% dos pacientes apresentados possuíam diagnóstico de diabetes mellitus.

No contexto inflamatório, níveis séricos de citocinas pró‐aterogênicas como TNF‐α, IL‐6 e IL‐17 têm sido encontrados elevados em pacientes com LES e SCA. Hiperhomocisteinemia, LDL‐oxidado e resistência à insulina também têm sido relatados nesse grupo. Além disso, a presença de atividade do LES parece estar diretamente relacionado ao risco do paciente apresentar IAM, principalmente em pacientes com atividade renal, redução do clearance de creatinina e anti‐DNA positivo1,2,4,10,13,14.

Alguns estudos têm mostrado que o uso crônico de corticosteroides pode contribuir de maneira independente para o desenvolvimento de aterosclerose precoce, além de aumentar índices de peso corpóreo e pressão arterial, e modificar o padrão plasmático de colesterol circulante1,10,15.

Na casuística apresentada incluindo somente pacientes com SCA observamos que o padrão angiográfico em todos os casos mostrava aterosclerose difusa, independente da presença de anticorpo antifosfolípide positivo, sendo que em 54% dos casos havia mais de uma artéria coronária acometida de maneira significativa, e não foram documentados casos de trombose coronária. Isso reforça os achados prévios de que a aterosclerose precoce é causa principal de IAM em pacientes com LES. Estudo publicado por Lee et al.7 mostrou em uma casuística de 25 casos de LES com doença coronária que 20% dos pacientes possuíam mais de uma lesão coronária significativa e também não relatou casos de trombose7. No entanto, algumas características peculiares mostradas em outros estudos não foram observadas nessa amostra de pacientes. Em nosso estudo, apenas 27% dos casos possuíam anti‐DNA positivo e o clearance de creatinina médio apresentava‐se preservado. Cabe ressaltar que, como marcador de atividade inflamatória, a proteína‐C reativa esteve elevada em apenas 45% dos pacientes e a velocidade de hemossedimentação em 73%. Além disso, C4 somente encontrou‐se reduzido em 27% dos pacientes, ao passo que C3 encontrou‐se diminuído em 73% dos casos.

Encontramos uma taxa de mortalidade intra‐hospitalar de 18% nesse estudo, índice cerca de três vezes superior à mortalidade relacionada à SCA na população em geral. Além disso, a prevalência de IAM com supradesnível de ST também se encontrou elevada, sendo praticamente o dobro da taxa encontrada em pacientes sem LES. Concordante com este achado, Roldan4 relatou em pacientes com SCA e LES um índice de mortalidade a curto e longo prazo pelo menos duas vezes maior do que a população em geral. No entanto, outro estudo em pacientes com LES pós‐angioplastia coronária, mostrou índice de mortalidade nulo, ressaltando a necessidade de estudos que avaliem características específicas do tratamento coronário nesses pacientes7. A melhor forma de abordagem intervencionista ainda é incerta. Taxas de eventos adversos (trombose/reestenose) relacionados a implante de stent coronário convencional e farmacológico foram relatadas em, respectivamente, 35 e 14% de pacientes com LES4,7. De maneira semelhante, séries de casos de pacientes com LES submetidos à CRM mostraram bons resultados e segurança apesar do número limitado de pacientes incluídos3,4,16,17.

Conclusão

Pacientes com LES têm risco maior risco de IAM comparativamente ao restante da população. Apesar da casuística limitada, os dados encontrados são semelhantes ao restante da literatura, ressaltando a precocidade da doença coronária, a presença de aterosclerose como desencadeante principal e a amplitude de sua gravidade com elevada taxa de mortalidade intra‐hospitalar.

Responsabilidades éticasProteção dos seres humanos e animais

Os autores declaram que os procedimentos seguidos estavam de acordo com os regulamentos estabelecidos pelos responsáveis da Comissão de Investigação Clínica e Ética e de acordo com os da Associação Médica Mundial e da Declaração de Helsinki.

Confidencialidade dos dados

Os autores declaram ter seguido os protocolos de seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes e que todos os pacientes incluídos no estudo receberam informações suficientes e deram o seu consentimento informado por escrito para participar nesse estudo.

Direito à privacidade e consentimento escrito

Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência deve estar na posse deste documento.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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